05 de Março de 2018
  • Pioneiro
  • Especial
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Perdemos um Gigante

Raul Anselmo Randon considerava que parar de trabalhar era o pior que podia acontecer a uma pessoa. O empresário que iniciou na labuta aos 14 anos, na pequena ferraria do pai, imaginava que viveria pelo menos até os 100 anos. Foi o que declarou em entrevista à Zero Hora em março de 2014. Não foi preciso completar o centenário de vida. Com sete décadas de trabalho incansável, o homem transformou o próprio sobrenome em sinônimo da Serra mais pulsante economicamente.

Partiu às 21h do último sábado, aos 88 anos. Randon morreu no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde estava internado desde 3 de dezembro de 2017, para uma cirurgia no quadril. Após várias complicações, sofreu uma parada cardíaca.

Catarinense de Tangará, foi em Caxias do Sul que o neto de imigrantes italianos ergueu um império que se mistura com o próprio desenvolvimento do segundo maior polo metalmecânico do Brasil. À frente das Empresas Randon, que tem origem na pequena oficina mecânica que fundou em sociedade com o irmão Hercílio, em 1949, e se expandiu para uma das maiores fabricantes de carrocerias de caminhão, autopeças e implementos agrícolas do planeta, o filho de Abramo e Elisabetha Randon construiu uma trajetória marcada pelo empreendedorismo, pela responsabilidade social e pela veia visionária. Baseava a confiança no sucesso de seus negócios naquilo que se tornou uma de suas máximas: “o transporte e a comida são as duas coisas que nunca vão terminar.” Foi assim que expandiu seu olhar para o agronegócio e para a gastronomia, conforme os filhos foram assumindo o controle das empresas da companhia. Desde 1979, o braço agropecuário das empresas Randon consolidou sete marcas no mercado, o que se pode compreender na frase que Randon cunhou ao associar seus produtos alimentícios aos restaurantes do Grupo DiPaolo, em 2016: “a qualidade sempre vence”.

Para além do empresário bilionário que emprega mais de 8 mil funcionários, o homem Raul Randon gostava da vida e se dedicava a suas paixões, muitas vezes, transformando-as em negócios. Das viagens anuais à Itália, por exemplo, abraçou a ideia de um amigo de produzir um queijo inédito na América Latina, o grana padano. Para comemorar as bodas de ouro com a mulher, Nilva, em 2006, produziu com a vinícola Miolo, da qual se tornou sócio, o vinho especial que leva as suas iniciais, RAR. Na fazenda em Vacaria, onde gostava de descansar e jogar cartas com os amigos, deu início à plantação de macieiras que o tornou o quinto maior produtor e exportador da fruta no Brasil, com 1,1 mil hectares plantados.

Foi a incursão na agropecuária que rendeu a Raul uma das histórias com as quais ele mais se divertia e gostava de contar, sendo muitas vezes convidado a relembrar em entrevistas. Após obter a licença para produzir o queijo tipo grana no Brasil, o empresário foi atrás de todo o equipamento mais sofisticado para iniciar os trabalhos. Mas não era o suficiente. Mesmo as vacas precisaram ser importadas. E foi assim que, num certo dia de 1996, o público que aguardava pelo desembarque de passageiros no Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, assistiu à chegada, em dois Boeings, de 130 novilhas holandesas trazidas dos Estados Unidos. Aliás, poucas coisas pareciam deixar Raul mais orgulhoso do que o sucesso com a produção do Gran Formaggio, nome dado ao queijo premium.

Ao mesmo tempo cativante e identificada com a Serra, onde sempre morou, a figura de Raul Randon fascina pela ascensão do ajudante de ferreiro que em pouco mais de meio século de trabalho ingressou na lista de bilionários da revista Forbes Brasil, com fortuna estimada em R$ 1,27 bilhão em 2013. Dos mais de cem títulos e honrarias que recebeu em vida, ter sido apenas o segundo brasileiro (o primeiro foi Jorge Amado) laureado Doutor Honoris Causa pela Universidade de Pádua, uma das mais antigas e célebres da Itália, tenha sido a mais importante. A honraria foi concedida em 2017. Sua trajetória foi contada em filme, livros e dezenas de entrevistas e perfis jornalísticos na imprensa de todo o país. Desta forma, o público pôde conhecer o homem que nadava três vezes por semana e o pai exigente de David, Roseli, Alexandre, Maurien e Daniel e avô dedicado de 10 netos.

Em uma das últimas entrevistas concedidas ao Pioneiro, ao lamentar a morte do empresário Paulo Bellini, em junho do ano passado, Raul Randon disse que o fundador e presidente emérito da Marcopolo ficaria para sempre na história de Caxias do Sul, por ser exemplo de empreendedorismo e por nunca ter parado de trabalhar. São também algumas das razões que tornam Randon o melhor símbolo da Serra que deu certo. Para sempre, uma página central na nossa história.

Adeus, seu Raul

Cerimônia hoje de manhã ocorre na Igreja São Pelegrino. Depois, corpo será cremado
O forte sotaque italiano, o apego à terra, o culto ao trabalho e o sobrenome que une a história de uma família a de uma empresa são marcas que fizeram de Raul Randon um homem que só poderia ter existido na Serra gaúcha, que ele próprio ajudou a forjar como é conhecida. Ontem, durante o velório no Memorial São José, todos lembravam do homem simples, mas de ações grandiosas. Até o início da noite, 3 mil de pessoas passaram por lá para homenageá-lo.

A cerimônia de despedida se iniciou oito minutos antes do previsto – às 16h. Assim que as portas do memorial se abriram, amigos e funcionários das empresas do grupo invadiram a sala C para o adeus ao empresário. O frei Jaime Bettega deu início às homenagens com uma cerimônia e destacou: “Que todos possam viver a solidariedade do momento. Sabemos que um dia teremos que partir, ninguém está preparado para este momento. A oração é uma forma de expressar nossos sentimentos”. Em seguida comandou o primeiro Pai Nosso.

Emocionada, Roseli, uma das filhas de seu Raul, foi a primeira a falar e lembrou de um pedido do pai durante uma reunião sobre a sucessão dos filhos nas empresas:

– Quero que vocês cuidem muito bem das pessoas que trabalham nas empresas, principalmente dos funcionários mais simples. Que eles tenham um salário digno e um plano de saúde adequado. Se algum dos gestores não se enquadrarem nesse pedido, que peçam licença.

Também agradeceu aos amigos e funcionários pelas ligações, mensagens e pelos abraços neste “momento muito difícil”.

O filho Alexandre também se manifestou e agradeceu o carinho que a família está recebendo:

– Ele foi um pai maravilhoso. Foi um pai para todas as pessoas que trabalharam com ele. Foi um pai de todas as crianças do Florescer. Onde quer que ele esteja, vai continuar fazendo o bem.

– Quem tem um pouco de fé vai entender o quanto ele continuará nos ajudando, nos apoiando e vibrando com as conquistas dele, que não se encerram aqui. Esse legado todo vai continuar.

O filho e atual diretor-presidente do grupo, David Randon, destacou a liderança do pai:

– É uma dor muito profunda. Nossa ideia é continuar o que ele planejou e já estamos fazendo isso há muitos anos. Ele sempre foi um grande líder e conseguia transmitir seus sonhos para todos que trabalhavam com ele.

A primeira cerimônia de despedida de seu Raul, na tarde de ontem, terminou ao som de Ave Maria, executada por dois violonistas.

O velório reabre ao público às 7h30min de hoje, na Igreja São Pelegrino. A missa será celebrada às 10h pelo bispo dom Alessandro Ruffinoni, frei Jaime Bettega e outros padres. A cremação ocorrerá ao meio-dia, no Memorial Crematório São José, e será reservada à família.

Corpo chegou pouco antes do meio-dia

O corpo do empresário chegou de São Paulo ao Aeroporto Regional Hugo Cantergiani às 11h20min de ontem. Alguns amigos e familiares aguardavam a chegada do corpo. Logo após, um cortejo com veículos da funerária e de familiares, escoltado pela Brigada Militar e pela Fiscalização de Trânsito, deixou o pátio dois do aeroporto em direção às capelas.

Algumas pessoas que tinham se reunido nas proximidades do terminal para acompanhar a chegada do corpo aplaudiram a passagem dos veículos.

“Perdi meu irmão gêmeo”, diz o médico Fernando Lucchese

Médico cardiologista de seu Raul há 20 anos, Fernando Lucchese chegou cedo ao velório. E lembrou da necessidade de cirurgia do amigo por causa das dores na coluna (leia na página 14).

– A estatura deste homem é imensurável.

O médico lembra de uma brincadeira que Raul fez ao comemorar o resultado do serviço de cirurgia cardíaca pediátrica implantado no Hospital Geral, resultado das contribuições dos convidados para a festa de casamento de 50 anos de casamento de Raul e Nilva.

– Ele respondeu a uma pergunta dos jornalistas e disse que a ideia tinha sido minha, seu irmão gêmeo. Agora perdi o meu irmão gêmeo – lamentou Lucchese.

O vice-governador gaúcho, José Paulo Cairoli, lembrou de Raul como grande empreendedor e homem com preocupação social.

– O projeto Florescer mostra a marca dele. Sem dúvida, deixa um grande legado para o Estado e a família já está dando a continuidade ao trabalho dele.

O secretário estadual de Planejamento, Governança e Gestão, Carlos Búrigo também veio ao velório e lamentou a morte, mas ressaltou que era momento de olhar os exemplos.

– Um homem que teve uma visão além do seu tempo. Que fez muito pelo empreendedorismo, mas não só isso. Por todo o local que passou, sempre foi alguém com uma atitude forte, olhando para o futuro, com otimismo e bons exemplos. Sempre cuidou para ser um líder familiar e olhava pelas pessoas que mais precisam em Caxias do Sul.

O governador José Ivo Sartori deve comparecer à missa e à cerimônia de cremação no final da manhã de hoje.

Expediente

As unidades da Randon em Caxias não terão expediente na manhã de hoje. A atividade fabril volta ao normal com o turno 2 (das 17h) no site Interlagos, e no turno 2 (15h15min) em Forqueta. As unidades localizadas fora de Caxias do Sul terão funcionamento normal.

Minuto de silêncio

No Alfredo Jaconi, houve um minuto de silêncio antes da partida entre Juventude e Grêmio em homenagem ao empresário. Ao final, os aplausos a seu Raul ocuparam todo o estádio.

De todos os lugares

No andar superior, foi montado um memorial com a trajetória do empresário. Fotos históricas, retratos e outros objetos relembravam a vida de seu Raul. Até as 21h, a estimativa era de que 3 mil pessoas já tivessem passado pelo local. Em uma das salas do Memorial, cerca de 250 coroas de flores, enviadas por entidades de toda a região e até por amigos italianos, decoravam o ambiente.

Foi um grande velório . Duas ambulâncias e quatro policiais militares estavam de prontidão à frente das Capelas São José, além de equipes de monitores que ajudavam a coordenar o fluxo de pessoas até a passagem pelo caixão e de segurança particular na área externa.

– Foram centenas ligações de todos os lugares do Brasil e do mundo. O fluxo de pessoas é contínuo e intenso. Não houve respiro – destacou Mateus Formolo, assessor da direção do Memorial São José.

Morte repercute na Itália

A morte do empresário caxiense Raul Randon repercutiu em todo o Brasil e até na Itália. A comoção de sua morte chegou até uma comunidade chamada Cornedo Vicentino, localizada ao Norte da Itália, próximo a Vicenza. Lá, seu Raul construiu um salão comunitário para os cerca de 3 mil habitantes. A notícia de sua morte entristeceu os moradores que conheciam o empresário caxiense de perto, pois ele esteve no local dezenas de vezes. Foi nesta comunidade que nasceu o avô de seu Raul, Cristóforo Randon.

O Gruppo Alpini Muzzolon, que representa a comunidade, manifestou-se via Facebook, lamentando a partida do empresário:

“Hoje faltou um amigo de nós alpinos e de toda a comunidade cornedese. Obrigado Raul por tudo o que você fez por nós nestes anos. Você nos ensinou a humildade, a amizade, o querer bem e a profunda importância da família. É uma pena não nos termos conhecido muitos anos antes.”

Sua morte também foi noticiada nos principais veículos de comunicação do Brasil.

Presenças

Na sala ao lado do velório, a esposa Nilva e os filhos receberam centenas de amigos e funcionários das Empresas Randon que foram levar sua força à família. Durante as horas iniciais do funeral, todos permaneceram de pé. Eles foram abraçados, recebiam apoio e também davam força para quem os cumprimentava, sempre destacando a simplicidade de seu Raul.

Por lá, estavam amigos como Astor Schimdt e Nelson Sbabo, que se consideram mais do que amigos, mas irmãos do empresário.

Palavras de gratidão

Líderes empresariais, políticos, comunitários, funcionários e entidades destacam a trajetória de Raul Randon a partir de uma diversidade de olhares sobre a vida do empresário

Depoimento

GERALDO SANTA CATHARINA Há 34 anos nas Empresas Randon. Entrou como coordenador de contabilidade de custos e hoje atua como diretor de finanças corporativas

Era uma pessoa extremamente acessível e carismática com todos que se aproximavam dele. Para ele, o ser humano estava em primeiro plano. Como trabalhávamos mais próximos, sempre que podia, passava na minha sala e falávamos sobre o trabalho e sobre a vida, sempre de uma forma tranquila, como era o jeito dele. Hoje, sinto que estamos meio órfãos. Posso dizer que os bens e o que construí foi também graças à empresa e ao seu Raul. Temos que reconhecer que ele ajudou a colocar Caxias do Sul no mapa-múndi. Há poucos meses, lembro que perguntei para o seu Raul se ele se arrependia ou faria de novo tudo que fez, e ele me disse assim: ‘Comecei com uma bigorna e um pavilhão. Hoje, tenho milhares de funcionários e toda essa estrutura. Acredito que fiz certo’.”

Michel Temer, presidente da República

“Faleceu na noite de ontem o amigo e empresário do setor de transportes rodoviários, Raul Anselmo Randon, fundador do conglomerado das Empresas Randon.

Uma pessoa visionária, que se tornou um dos maiores geradores de emprego do país. Homem simples de Caxias do Sul que levou a cidade ao reconhecimento nacional e internacional.

Deixa como legado uma família de trabalhadores que darão continuidade à geração de empregos e à solidariedade que era peculiar ao seu dia a dia. Meus sinceros sentimentos aos familiares e colaboradores.” (Pelo Twitter)

Nelson Sbabo, ex-presidente da CIC

“Ele vai fazer muita falta. Como líder, como empresário, como ser humano. Quando ele ainda tinha uma oficina mecânica na Rua Matteo Gianella, fui lá oferecer material de construção, pois fiquei sabendo que ele iria construir uma grande empresa. Raul ainda participava ativamente da direção da empresa. A última palavra ainda era a dele.”

José Ivo Sartori, governador do Estado

“Acabo de receber a triste notícia do falecimento de Raul Randon. O Rio Grande do Sul e o Brasil perdem uma grande liderança empreendedora, cuja simplicidade era sua principal característica, tanto que estava sempre presente no chão de fábrica. (...) Sem esquecer da sua postura, da forma transparente de expor posições e da maneira acessível e solidária de ser. Nossos sentimentos à dona Nilva, seus filhos e a toda a família Randon.” (Pelo Twitter)

A exemplo da prefeitura de Caxias do Sul, o governo do Estado não decretou luto oficial. A assessoria de imprensa informa que a situação destinada ao falecimento de ex-ocupantes de cargos públicos e não poderia abrir precedentes.

Dom Alessandro Ruffinoni, bispo diocesano

“Seu Raul muito atuou como católico e deu exemplo de vida, de bom pai e de bom empresário. Ajudou a cidade a crescer. Ele sonhou e realizou muitas coisas boas para Caxias do Sul. Gostaria que agora, que ele está no céu, pudesse olhar para sua cidade, para que os sonhos que ele teve, de união e crescimento, continuem aqui entre nós.”

Ivanir Gasparin, presidente da CIC

“Ele foi o marco divisor da nossa cidade. O mais importante é imaginar o que seria Caxias do Sul sem a contribuição dele. A minha relação com ele era muito boa e de muito respeito. Sempre foi uma pessoa que pensou no desenvolvimento coletivo. No final do ano passado, tivemos um encontro junto com Nelson Sbabo (ex-presidente da CIC).”

Tânia Tonet, historiadora

“Eu chegava cedo no seu apartamento e da dona Nilva. O senhor já tinha voltado da natação e me convidava para tomar café: pão, mel e queijo. Depois, eu ligava o gravador e penetrava no seu mundo ouvindo as histórias de sua vida. Várias vezes tive que ser insistente, pois o senhor nunca foi de muitas palavras, mas sim, de muitas ações. Por mais de um ano essa rotina se repetiu. (...) Todos esse material se concretizou na obra Os Olhos de Quem Vê, traduzida em palavras pelo Diogo Osório Coelho, pelo Charles e por mim. (...) Esse trabalho nos deu a oportunidade ímpar de conviver muito de perto com esse ser humano, que veio para esse plano para nos ensinar. Seu Raul foi um sábio, mais que um empreendedor e um líder excepcional.”

Emílio Finger, diretor da Master Franquia Caxias do Sul, empresa do grupo Randon SA

“Além de sua simplicidade, era um líder que comandava uma empresa como ninguém. Tudo o que ele tocava, se transformava. Ele reconhecia que tudo o que construiu foi através das pessoas. Ele realizava seus sonhos por meio das pessoas que o cercavam.

Caxias do Sul tem que agradecer. Vai fazer muita falta.”

José Fernando Martins, vice-presidente de Relações Internacionais da Marcopolo

“O que tenho a dizer é que ele era uma pessoa extraordinária, estrategista, corretíssima. Não só Caxias, mas o Brasil vai sentir falta de seu Raul.”

Lourenço Castellan, Florense

“O Raul é um grande amigo, inclusive, eu que fiz os móveis para a casa dele. Uma pessoa espetacular, que deixa um exemplo para todos que conviveram com ele. Foi um marco para o desenvolvimento da região de Caxias do Sul. Ele merece ser lembrado todos os dias.”

Adelino Colombo, Lojas Colombo

“Uma pessoa humilde em sua essência. Sua preocupação com o desenvolvimento econômico e social o fez investir em obras que registram a força de seu legado, como o Programa Florescer, exemplo de atitude de um grande homem.”

Germano Rigotto, ex-governador

“Tinha uma relação muito boa, ligava para o seu Raul nos aniversários dele, e era ele pessoalmente que atendia a ligação no celular. Caxias perde, o Estado perde. O seu Raul, junto com Valter Gomes Pinto e Paulo Bellini, comandou o desenvolvimento da cidade através de suas empresas. Por mais que ele tenha encaminhado a sucessão, e ele encaminhou muito bem, é a figura dele, e o que ele representou, o que fez de lutas que ele venceu, de empresas que construía, é esta marca incrível que fica. É uma perda muito grande.”

Gilberto Porcello Petry, presidente da Fiergs

“Estava sempre de bom humor. Sempre disposto a fazer um novo investimento. A última vez que falei com ele, no ano passado, ele ainda me falava sobre os planos que tinha, o que ia fazer. Quer dizer, mesmo aos 88 anos, ele não parava, estava sempre na ativa, inquieto. Era um realizador de sonhos.”

Evaldo Kuiava, reitor da UCS

“O seu Raul deixa um legado para a comunidade. Foi uma pessoa que soube

empreender na vida pessoal, na vida empresarial e nas relações com a

comunidade. É um exemplo de vida para todos. Tinha habilidade de agregar as pessoas. Cabe a nós darmos continuidade a todo o exemplo que ele deixou.”

Astor Milton Schmitt, amigo e diretor de Economia, Finanças e Estatísticas da CIC Caxias

“O momento é de tristeza e de muita dor. Mesmo sabendo que estava hospitalizado e fragilizado, estou muito doído. Estão me faltando palavras para definir o que estou sentindo neste momento. Ele foi meu sócio, meu pai, meu amigo, meu parceiro. Fomos cúmplices por mais de 50 anos.”

Depoimento

DANIELA GIOVANA CORSO, Arquiteta, 42 anos, filha de seu Dalvi Rui Corso, 75 anos, funcionário da Randon por 27 anos, aposentado como supervisor de setor de pós-vendas

Meu pai trabalhou anos na Randon. Aposentou-se lá. Das lembranças mais tocantes, ficam as festas de final de ano para os funcionários. A festa era para todas as famílias dos funcionários. Todas. Do chão de fábrica à diretoria. E acontecia no pátio da Randon. Preferi escrever esse texto sem consultar o meu pai, mas eu penso que a festa reunia umas 5 mil pessoas, entre adultos e crianças. E seu Raul estava lá. Apertando a mão de todos e chamando muitos, mas muitos mesmo, pelo nome. Lembro que ganhávamos um tíquete para retirar os nossos lanches e brinquedos. Ontem (sábado) à noite, ao saber da morte do seu Raul, de imediato me veio essa lembrança, adormecida lá no fundo da memória entre muitas. Meu pai fez silêncio no grupo da família. Imagino que outras tantas vieram até ele. Fica aqui a minha pequena homenagem ao Raul Randon. Um visionário nato, um cidadão de irretocável caráter e um homem de boníssimo coração.”

Frei Jaime Bettega

“Além de empreendedor, eu sempre o olhava como um homem de fé. Tinha convicção religiosa, possuía grande intimidade com Deus. Ele conseguia harmonizar a oração com a ação. Seu amor para com as crianças e adolescentes, em situação de vulnerabilidade, era uma extensão do seu amor a Deus. Ajudou inúmeras comunidades religiosas, participava dominicalmente da celebração, educou a família na fé. Cumpriu digna e honrosamente sua missão.”

Clovis Tramontina, presidente do Conselho de Administração da Tramontina

“Além de um grande amigo, foi um dos pilares do desenvolvimento da economia da Serra. Era um apaixonado pelos negócios. O empreendedorismo estava no sangue dele. Ele alavancou a indústria e deu trabalho para milhares de pessoas.”

Vania Herédia, historiadora

“Eu o defino como um homem visionário. Empresário que marcou pelas ações na indústria o desenvolvimento econômico regional. Sempre enxergou além do tempo dele. Ele e o Bellini (Paulo Bellini, fundador da Marcopolo) e outros empresários do ramo metalmecânico trouxeram para Caxias essa questão do polo (industrial)”.

Daniel Guerra, prefeito de Caxias do Sul

“Raul Randon foi sinônimo de empreendedorismo. Foi um exemplo de perfil visionário, que, aliado a muito trabalho, contribuiu para o progresso e o desenvolvimento da nossa cidade. Ele levou o nome de Caxias do Sul para o Brasil e para o mundo. Além do grande empresário, perdemos um ser humano humilde e preocupado com as pessoas.”

A prefeitura não decretará luto oficial pela morte do empresário, informou a assessoria de imprensa, que destacou ser esta situação aplicada apenas a mortes de ex-prefeitos.

Reomar Slaviero, presidente do Simecs

“Tudo o que seu Raul idealizava, conseguia concretizar. Impressionante seu talento para os negócios. Ele pensava muito à frente. Era um homem de bom coração, simples, humilde. O que me consola é que ele deixa um legado e que, tenho certeza, a família vai levar em frente.”

Pepe Vargas, deputado estadual

“Seu Raul tinha uma preocupação muito forte com a comunidade dele. Era uma geração de grandes empresários, com muito poder econômico, mas cultivava a simplicidade com as pessoas da comunidade. Ele não era simplesmente o empresário. Emprestava seu tempo à comunidade. Sempre teve capacidade de dialogar com todas as correntes de pensamento. Conversava com todo mundo. Era uma figura extraordinária.”

Paulo Paim, senador

“Encaminharei nesta segunda-feira um voto de pesar ao Senado. Gerou milhares de empregos ao longo de toda sua vida. Foi um empresário bem sucedido e tinha visão social. Que os exemplos dele sejam seguidos por outros. Meu pai, seu Ignácio, trabalhou como vigilante na Marcopolo, na Guerra e na Randon. O pai tinha um cachorro chamado Tupi e fazia a ronda com ele. Eu era moleque e acompanhava o pai. Ficou esse vínculo ao natural. Foi uma vida belíssima.”

Amadeu Boeira, prefeito de Vacaria

“Será lembrado como um Midas (personagem da mitologia grega reconhecido em transformar em outo tudo o que tocava), pois cada produto que passou pelas suas mãos é sucesso pela qualidade. Foi responsável pela geração de empregos há cerca de 30 anos. Contribuiu com serviços sociais junto à comunidade vacariense.”

Mauro Pereira, deputado federal

“Eu ligava pra ele, ou ele me ligava, aos domingos de manhã, ali por volta das 9h da manhã. Ele falava, ele dava conselhos, ele fazia as críticas dele, mas era um amigo. Deixou um legado, deixou a família, ele primava pela amizade. O maior orgulho dele era gerar emprego. Ele dizia: ‘Vocês façam a parte de vocês porque eu não quero demitir mais. Eu não posso demitir mais’.”

ENTIDADES

CDL Caxias

“De forma incansável, Raul construiu uma história baseada em valores de família, trabalho e comunidade. “ Ivonei Pioner, presidente da CDL Caxias

Microempa

“Perdemos uma referência nacional de líder empresarial. A Microempa tem muito a agradecer ao senhor Raul Randon pelo incentivo recebido desde a sua criação.( ...) Muito do desenvolvimento tecnológico e econômico de Caxias do Sul se deve à sua visão. Ele se preocupou em educar pessoas.” Jovenil Vitt Lima, presidente da Microempa

Câmara de Vereadores de Caxias do Sul

Por meio de nota, a Câmara manifestou pesar pelo falecimento, “de um dos caxienses mais ilustres de sua história”.

“Sua visão comunitária foi marcante na colaboração com a Festa da Uva e em obras sociais nas quais se envolveu.”

Em maio do ano passado, Raul Randon esteve na Câmara para participar da homenagem ao Programa Florescer, do Instituto Elisabetha Randon, do qual foi criador e entusiasta.

Câmara de Indústria, Comércio e Servicos (CIC) de Caxias do Sul

“Raul Anselmo Randon realizou uma das gestões mais marcantes na entidade, nos anos de 1975 a 1978, com destaque para a construção da sede onde hoje está instalada a CIC. Empreendedor, incansável, carismático, dono de grande simplicidade e visionário, inspirou gerações de executivos e empresários.”

A reunião-almoço de hoje, na CIC, foi cancelada.

Sindicato das Indústria Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs)

“O Seu Raul como sempre foi chamado, caracterizou-se como um extraordinário empresário, sendo reconhecido pela magnífica história de vida e trabalho. Herdeiro de uma simplicidade única, ao longo dos seus 88 anos de vida construiu a trajetória vencedora do grupo Randon ao lado do seu irmão Hercílio (in memoriam), alcançando projeção internacional.”

Criador de um império empresarial

Empresas Randon empregam quase 8 mil funcionários, exportam para mais de cem países e faturam R$ 5 bi
Raul Anselmo Randon não criou apenas uma empresa. Desenvolveu um império industrial, erigido sob o pilar da profissionalização e do olhar aguçado no futuro. Ao lado do irmão, Hercílio (conhecido pelo apelido de Nino, falecido aos 64 anos, no dia 28 de abril de 1989), fundou em 1949 aquele que viria a tornar-se o maior grupo de implementos rodoviários da América Latina, e entre os principais do mundo.

Incluindo as unidades no Brasil e no Exterior – no total, são 14 fábricas –, o conglomerado de Empresas Randon emprega quase 8 mil funcionários, dos quais 6,9 mil nas plantas fabris em Caxias do Sul. Depois de ser afetada nos últimos três anos pela crise econômica que respingou fortemente no setor automotivo pesado, o grupo Randon viu os negócios serem retomados com mais força a partir do segundo semestre de 2017. Para 2018, a estimativa é alcançar receita bruta total de R$ 5 bilhões – entre os dois maiores faturamentos de Caxias, ao lado da Marcopolo.

Hoje, a empresa fabrica implementos rodoviários, vagões ferroviários, autopeças, veículos fora de estrada e opera com administração de consórcios e banco próprio. No portfólio de produtos, estão semirreboques, reboques e carrocerias, nas modalidades graneleiro, carga seca, tanque, basculante, silo, frigorífico, canavieiro, florestal, sider e furgão. A Randon é protagonista da expansão do transporte rodoviário de cargas no país e no Exterior há quase 70 anos (a serem completados em 2019).

Em 2004, o grupo Randon ingressou no segmento ferroviário, complementando portfólio de produtos para o transporte de carga, com os vagões do tipo hopper, gôndola, tanque, carga geral, sider e plataforma. Parcela significativa da produção do grupo é direcionada ao mercado de reposição e às exportações para mais de cem países.

‘Doutor engenheiro’

Apesar de não ter concluído o ensino primário, seu Raul está ligado aos conceitos de progresso e desenvolvimento. E sempre atuou em causas empresariais e sociais. Foi presidente da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias de 1975 a 1978. No final de maio de 2017, entrou para a história como o primeiro empreendedor brasileiro a conquistar a Láurea Doutor Honoris Causa em Ingegneria Gestionale, concedida pela Universidade de Pádua, na Itália. Em uma das últimas homenagem, concedida pela CIC, durante reunião-almoço em junho de 2017, o empresário usou de sua característica simplicidade para relatar a honra de receber do país de seus antepassados a condecoração de “doutor engenheiro”.

– Sou uma pessoa que poucas vezes sentou no banco do colégio. Mas sentei no banco do trabalho – discursou no encontro, quando foi aplaudido de pé pelos participantes.

Percepção no potencial do transporte rodoviário

Ao findar da Segunda Guerra Mundial, o transporte de cargas por caminhões no mercado brasileiro ganhou impulso por conta de dois fatores: o desenvolvimento da economia brasileira e a limitação/e ou sucateamento de transporte por ferrovias.

Em 1949, os irmãos Hercílio e Raul Randon empenharam audácia, talento e esforços na oficina do pai, inicialmente para dar conta da falta de peças de reposição e de freios voltadas ao mercado de extração e beneficiamento de madeira. Após prestar o serviço militar obrigatório, seu Raul uniu-se ao irmão, habilidoso em mecânica.

O potencial do mercado para transporte de mercadorias por estradas brasileiras foi o combustível que movera os irmãos. No ano em que a dupla começou o trabalho de forma informal, a frota brasileira de caminhões era de 160 mil unidades, quando a necessidade nacional perfazia 30 mil/ano. O contexto também foi favorecido na década seguinte com o processo da industrialização no Brasil.

Após trabalhar de forma embrionária na oficina do pai, os irmãos Raul e Hercílio constituíram em 18 de dezembro de 1952 a Mecânica Randon. O início das atividades foi em 2 de janeiro de 1953, quando foi admitido o primeiro funcionário.

A descrença, nos primórdios, foi generalizada.“Mas os visionários fabricantes de autopeças conseguiram vencer os obstáculos”, enfatiza o livro Randon Meio Século de Trabalho, lançado em 1999.

A partir de 1952, Raul e Hercílio idealizaram um implemento chamado de reboque para o transporte de toras de pinheiro trazidas dos matos rumo às serrarias. Desde então, a solicitação de produtos cresceu mês a mês. Hercílio fazia os moldes em madeira e alumínio. Os clientes vinham de São Paulo, do Paraná e até do Nordeste. Sem crédito, traziam o dinheiro na mala. Raul respondia pela área administrativa e financeira: convertia os recursos faturados em matéria-prima e máquinas. A partir daquele momento, a empresa foi crescendo. Houve, no entanto, períodos de dificuldades, de concordata, que foram vencidos e servem de ensinamentos para enfrentar desafios.

Na edição de 24 de setembro de 1984, a revista Bolsa (RJ) enfatizava o desempenho pós-recessão de 1982, sob o título “Randon sai da concordata e retorna à trilha aberta pelo lucro”.

Com a perda precoce do irmão, aos 64 anos, Raul contou com a força de seus filhos e de executivos de credibilidade para fazer valer a máxima de que o lucro da empresa precisa ser reinvestido na própria empresa.

CONGLOMERADO

O grupo Randon iniciou as atividades em 1949, quando os irmãos Hercílio e Raul Randon, que trabalhavam na fabricação de ferramentas agrícolas, decidiram abrir uma oficina para reforma de motores industriais.

A Randon SA Implementos e Participações, holding controladora, é estruturada em três divisões:

Divisão Montadora: Randon Implementos/Veículos, Randon Argentina e Randon Peru.

Divisão Autopeças: Fras-le, Master, JOST e Suspensys.

Divisão de Serviços Financeiros: Randon Administradora de Consórcios, Racon, e Banco Randon.

No Brasil, a empresa está presente no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e em São Paulo.

Em Caxias do Sul: no bairro Interlagos, estão congregadas Randon Implementos, Randon Veículos, Suspensys, Master, Castertech e JOST, além da unidade de Consórcios. O Banco Randon opera em outro bairro, o Universitário. E em Forqueta está situada a Fras-le. Além disso, integra o grupo Freios Controil, de São Leopoldo.

Em Santa Catarina: está instalada a Randon Brantech (Chapecó). Em São Paulo fica a Randon Araraquara, que será oficialmente inaugurada em 28 de março de 2018.

Fora do Brasil: a companhia está presente, por meio da Fras-le, na China (Pinghu) e nos Estados Unidos (Alabama). E, em Santa Fé, figura com a Randon Argentina. No próximo dia 15, está prevista a inauguração da Randon Peru, em Lima. Também atua através de associações e parcerias em vários outros países.

Em 2016, a Randon Implementos alcançou a marca histórica do produto de número 400 mil. Trata-se de um semirreboque basculante.

Principal exportador brasileiro de implementos rodoviários, a Randon é responsável por cerca de 70% das unidades exportadas a partir do Brasil.

De hobby à referência no agronegócio

Paralelamente à atividade na indústria, Raul Anselmo Randon fez de sua paixão pelo campo um negócio altamente rentável. A Randon Agro-Silvo Pastoril (Rasip) nasceu em Vacaria em 1979. Em 2011, a marca corporativa passou a ser composta pelas iniciais do idealizador: RAR. Rasip se tornou a marca de produtos.

Com faturamento anual na faixa de R$ 300 milhões, a RAR conta com 900 trabalhadores fixos e aposta em diferentes vertentes, como a produção de maçãs, uvas, laticínios, entre outros. Além disso, possui uma área de oliveiras e conta com 4,2 mil hectares para a produção de soja, trigo e milho.

Em época de colheita de safra, mais de 2 mil pessoas se somam ao grupo de trabalhadores. Desta maneira, tornou-se a segunda maior empregadora do município dos Campos de Cima da Serra.

Atualmente, as três fazendas da empresa contabilizam 1,1 mil hectares de pomares. A Rasip, que se tornou uma das divisões da RAR, é a segunda maior produtora de maçã do Brasil, com uma colheita de mais de 50 milhões de quilos ao ano. Nos anos 1990, a marca também foi precursora na exportação da fruta brasileira. Atualmente, vende para mais de 10 países da Europa e da Ásia.

O envolvimento de seu Raul com a agricultura era uma paixão antiga, já que na infância ajudava os avós a cultivar a terra. No embalo dos incentivos fiscais do governo federal, que permitia o reflorestamento com árvores frutíferas, em 1976, deu início ao plantio das primeiras mudas de macieiras. Após três anos, foi fundada a Rasip, hoje uma das principais produtoras de maçã do país.

– Achei que esse era um bom negócio, já que quase toda a fruta consumida no Brasil era importada – explicou o empresário.

O negócio frutificou, e a RAR planeja chegar a 2019 com faturamento anual de R$ 300 milhões. Com isso, a produção deflagrada em pouco mais de 200 hectares alcançou área de 1,1 mil hectares em quatro décadas. Na safra, a Rasip processa 50 mil toneladas de maçãs das variedades gala e fuji, que não atendem só a consumidores nacionais, mas também a estrangeiros.

A RAR hoje é comandada por um dos genros de Randon, Sérgio Martins Barbosa. Às maçãs e aos queijos, vieram outros produtos de excelência como o vinho RAR, em 2006.

– No começo, eu só queria fazer um vinho para comemorar minhas Bodas de Ouro, mas a Miolo quis fazer mais garrafas e eu fui tomando gosto pela brincadeira – contava ele. Hoje são em torno de 70 hectares de vinhedos.

Dez anos depois, em 2016, o RAR ganhou a versão espumante, que embalou a festa de 60 anos de casamento de seu Raul e dona Nilva. A bebida foi uma homenagem à esposa, com a marca Cuvée Nilva Brut Rosé.

Se Raul Randon tivesse apenas criado a Rasip, já seria um grande empresário brasileiro do ramo do agronegócio. Mas esse é apenas um hobby que virou uma marca imponente num mercado promissor e que, ao lado do transporte, nunca parará: o da alimentação.

Por isso, o empresário sempre dizia que buscava investir nesses filões vitais.

Motor da economia caxiense e vacariense

Uma das 10 maiores fabricantes de semirreboques no mundo. Segunda maior fabricante brasileira de vagões ferroviários. Maior fabricante nacional de caminhões fora de estrada de 30 toneladas. Líder nacional na fabricação de materiais de fricção, freios a ar, suspensões, eixos e componentes comerciais. Uma das maiores fabricantes de materiais de fricção do mundo.

Essas são algumas das marcas das Empresas Randon hoje em dia. E Raul Anselmo Randon teve um papel fundamental para a obtenção de cada um desses títulos.

Referência nacional no segmento automotivo, a Randon tem grande peso na economia do Rio Grande do Sul e mais ainda em Caxias do Sul, onde está sediada. É um motor econômico de Caxias. Se o grupo está em um bom momento, certamente o município também estará.

Apenas a Randon Implementos tem um faturamento anual próximo aos R$ 4 bilhões, enquanto a Fras-le tem uma receita que gira na faixa de R$ 1,2 bilhão ao ano. Os números expressivos tornam a Randon uma das maiores empresas da região Sul.

De acordo com o ranking 500 Maiores do Sul, produzido pela Revista Amanhã, a Randon é 11ª maior companhia do Estado e a 31 na região. No segmento de semirreboques, possui 40% do mercado brasileiro, mesma fatia do nicho de vagões ferroviários.

Uma das principais características das empresas do grupo é a presença internacional. A Fras-le é a segunda maior exportadora de Caxias do Sul, de acordo com dados do Ministério de Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), e a Randon Implementos é a quarta.

No grupo, também há espaço para atividades fora da indústria. A Randon tem um banco e se destaca no ramo de consórcios por meio da Racon, empresa criada em 1991. Até o momento, a Racon já distribuiu mais de R$ 8 bilhões em créditos e contemplou mais de 86 mil clientes. A marca possui pontos de venda em 15 Estados brasileiros, tendo como foco os consórcios para aquisição de veículos e imóveis.

Em vida, mais de 150 homenagens

Desde a década de 1960, executivo com uma das melhores reputações recebe distinções
Em 1969, Raul Anselmo Randon recebeu aquele que seria a primeira de uma imensa lista de homenagens públicas que seriam dadas a ele em vida: a Medalha Destaque no Setor da Indústria, da Rádio Difusora foi seguida por dezenas de reconhecimentos. O Troféu Mérito Industrial – Personalidade do Ano foi concedido ao empresário na categoria Indústria e outorgado pela Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) em 1973. Em 1977, conquistou o Troféu Homem de Aço, conferido pela Associação do Aço do Estado do Rio Grande do Sul.

Um dos executivos no ranking de líderes com melhor reputação, segundo a revista Exame, Raul Randon colecionou distinções pela sua atuação como empresário da indústria e do agronegócio, líder empresarial, apoiador da segurança e da segurança no trânsito, e por sua atuação em prol da educação e do desenvolvimento econômico e social.

Evidentemente, a construção de um dos maiores empresários brasileiros a partir de Caxias do Sul não poderia deixar de ser coroada também com o título de Cidadão Caxiense, conferido em 1988. Um ano depois, também foi condecorado com o título de Cidadão Vacariense.

Em 1999, foi eleito uma das personalidades que marcaram o século em Caxias, na categoria empresário. Em 2002, recebeu do presidente da República Fernando Henrique Cardoso a Medalha Mérito Mauá, categoria Cruz Mauá, como reconhecimento pela inestimável colaboração prestada ao desenvolvimento do transporte no Brasil. E em 2006, foi homenageado com a Medalha Pacificador da ONU Sérgio Vieira de Mello, pelo Parlamento Mundial para Segurança e Paz, com sede em Palermo, na Itália. A distinção é dada a brasileiros que promovem a paz através do desenvolvimento econômico que resulte em melhor distribuição de renda e emprego.

Em 2015, foi destacado com o Empreendedor da Década, no Prêmio Lide de Empreendedorismo, promovido pelo Grupo de Líderes Empresariais.

A última dessas honras ele receberia em 5 de outubro de 2017, ao conquistar o prêmio Líderes & Vencedores, da Assembleia Legislativa gaúcha e da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), na categoria Referência Educacional pelo projeto Florescer, que, ao longo dos últimos 15 anos, tem sido uma das iniciativas mais bem sucedidas tanto na região quanto no resto do país, com filiais em Vacaria, Bento, Maringá (PR) e Ribeirão Preto (SP).

O ano de 2017 trouxe também uma das honras mais importantes de sua vida: foi laureado Doutor Honoris Causa em Ingegneria Gestionale, concedida pela Universidade de Pádua, na Itália, em 26 de maio, além de receber homenagens da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul (CIC), em junho, e do Sindicato das Indústrias de Material Plástico do Nordeste Gaúcho (Simplás), em julho passado. Os dois últimos reconhecimentos pela contribuição ao desenvolvimento econômico, industrial e social da região e do país.

Todos esses prêmios acabam, apesar de grandiosos, sendo uma síntese das homenagens recebidas por Raul Randon em vida. Foram mais de 150 reconhecimentos públicos que ajudam a dimensionar grandiosidade do empresário, em âmbito regional, mas também em níveis nacional e internacional.

Empresário também quis educar

Por meio do Instituto Elisabetha Randon, empresário ajudou garantir um futuro melhor a 1,5 mil de crianças e jovens em 15 anos
Raul Anselmo Randon deixou uma herança que dificilmente será esquecida por famílias que testemunharam suas crianças e seus adolescentes se tornarem cidadãos melhores e com um futuro mais promissor. O empresário criou o Instituto Elisabetha Randon, em 2003, para onde direcionou ações na educação, na cultura, na assistência social e no voluntariado. Por meio do projeto, filhos de funcionários ou crianças que moram em bairros pobres puderam trabalhar em uma das empresas Randon, aprender inglês, dominar informática, ter empregos dignos e até chegar à faculdade.

O carro-chefe do instituto é o projeto Florescer (criado antes, em 2002) e que beneficia, gratuitamente, crianças e adolescentes dos seis aos 14 anos. Ele disponibiliza atividades pedagógicas, culturais e esportivas e funciona de segunda a sexta-feira, no turno inverno à escola regular.

– O que a gente quer aqui é mostrar que existe um futuro para eles. Que, se forem pessoas corretas, estudarem e depois trabalharem, poderão um dia ser até diretores de uma empresa – explicou seu Raul em entrevista ao Pioneiro em 2003.

O Florescer surgiu de um projeto pessoal do empresário. Ele queria criar um programa e um local que fossem referência para jovens que enfrentam dificuldades em casa ou na escola e, dessa forma, permitir que recebessem a oportunidade de um futuro mais seguro. Por isso, além de o Florescer beneficiar crianças, jovens de 15 a 16 anos podem participar do Florescer Iniciação Profissional. A proposta ajuda na inserção no mercado de trabalho, por meio de uma formação técnica e humanística. É possível, inclusive, que os integrantes trabalhem em uma das empresas do grupo.

– Grande parte desses nossos jovens tinha problemas de repetência no colégio. Depois que vieram para o Florescer, nenhum rodou – orgulhava-se Randon.

O índice de aprovação dos participantes na escola já chegou a 100% – no último relatório de desempenho divulgado no site da Randon, o índice está em 96%. Estima-se que a Randon desembolse cerca de R$ 1,3 milhão por ano para a iniciativa. O resultado do investimento está estampado nos rostos de mais de 500 jovens que já concluíram os cursos.

Johnatan Boeira Rodrigues, 24 anos, é um deles. O professor das redes municipal e estadual é filho de um pintor que completou 25 anos de Randon. João Carlos Rodrigues, 46 anos, apresentou o filho ao departamento de Recursos Humanos para pleitear uma vaga na primeira turma, em 2002. Graças ao Florescer – e ao empresário Raul Randon –, Johnatan participou do coral, fez aulas de violino, mecânica, comércio e serviço e foi estagiário no Florescer. Fala inglês e domina informática. Começou faculdade de Matemática em 2011 no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS).

O jovem trabalha três turnos por dia em três escolas diferentes e garante que o projeto social guiou sua escolha profissional. Além dele, os outros três irmãos passaram pelas classes do Florescer. Todos seguiram pelo caminho que Randon sugeria ao encontrá-los.

– O seu Raul sempre interagiu conosco. Nos cobrava muito aprender inglês. No abraçava e nos sentíamos próximos dele. Ele nos ensinava que qualquer sonho era possível, era só estudar e trabalhar bastante – ensina Johnatan.

O INSTITUTO ELISABETHA RANDON

- O Instituto Elisabetha Randon, fundado em 2003 por Raul Randon, é uma Organização da Sociedade Civil com Interesse Público.

- O objetivo é promover a cidadania e o desenvolvimento social, por meio de ações direcionadas à educação, à cultura, à assistência social e ao estímulo à prática do voluntariado.

São desenvolvidos os projetos:

- Florescer: programa de contraturno escolar para crianças e adolescentes de 6 a 14 anos.

- Florescer Iniciação Profissional: programa que prepara jovens para uma melhor inserção no mercado de trabalho.

- Rede de Parceria Social: desde 2008, o Instituto Elizabetha Randon passou a integrar o programa Rede de Parceria Social promovido pela Secretaria de Justiça Social do Estado do Rio Grande do Sul.

- Ser Voluntário: lançado em 2005, visa a estimular a força de trabalho das Empresas Randon a desenvolver ações, junto a entidades e escolas públicas da comunidade.

- Vida Sempre: oferece informações educativas a motoristas e pedestres, visando orientá-los para um comportamento adequado e seguro no trânsito.

FLORESCER

- Iniciativa de Randon, o projeto prepara crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social para o exercício da cidadania e uma qualidade de vida melhor.

- Consiste em um centro de atendimento que beneficia, gratuitamente, crianças e adolescentes, disponibilizando atividades pedagógicas, culturais e esportivas.

- 50% das vagas é reservada para filhos de funcionários, e a outra metade, para crianças e adolescentes de comunidades em vulnerabilidade social.

- Funciona no turno inverso da escola regular.

- Atende atualmente 360 alunos em Caxias, em dois núcleos de empresas Randon. Além disso, conta com franquias consolidadas em Ribeirão Preto (SP), em Bento Gonçalves (RS), em Maringá (PR) e duas em Vacaria (RS). A metodologia do Programa Florescer é disponibilizada pelo Instituto Elisabetha Randon como modelo a outras instituições que quiserem adotar a iniciativa. Neste ano, 654 crianças e adolescentes são beneficiados pelo programa e suas franquias sociais.

O homem por trás do mito

As cavalgadas de aniversário e outras paixões pessoais
A ideia de que o empresário Raul Randon tem um toque de Midas talvez seja uma das versões mais presentes no imaginário das pessoas. Pudera. O menino, que começou a trabalhar muito jovem e construiu um império, continuou acertando nas escolhas e transformando até atividades sem pretensão em dinheiro. Como o vinho que fabricou para homenagear a mulher, Nilva, nos 60 anos de casamento, que se tornou sinônimo de excelência da bebida, engarrafada pela Miolo: o Espumante Cuvée Nilva.

Como quase tudo que nasceu como hobby virou negócio, uma das poucas atividades não lucrativas que praticava era o carteado. Sem apostas.

– Se quero ganhar dinheiro, vou trabalhar. Jogamos à flauta – brincava, acrescentando que perdedor “não pode ficar brabo”.

Gostava de ir a Vacaria e jogar com amigos. Gostou de visitar Las Vegas – viajou o mundo, mesmo sem ter tido tempo para folga durante a lua de mel ou nas celebrações dos 50 anos de casado – e recomendava o destino, especialmente para quem não gostava de jogar – “aí, não perde”. Em cruzeiros, gostava da roleta, mas levava US$ 2 mil e apostava só US$ 1 mil – jeito escolhido para não perder tudo.

O senhor de quase 2m de altura e olhar sereno foi capaz de cativar muita gente por onde passou. O título Homem de Aço – cunhado pela prosperidade na indústria metalmecânica – sempre contrastou com a personalidade de um empresário doce, capaz de ajudar a construir uma sociedade mais justa e focada na responsabilidade social. Além do Projeto Florescer, empenhou-se no auxílio a muitas entidades, como a Apae e a Patna.

Sabia viver em comunidade e se lembrava de todos com respeito. Fazia-se presente sempre que podia – e quase sempre podia. Fosse esse compromisso homenagem a amigos, eventos sociais ou filantrópicos. Saboreava sentar ao redor de uma mesa com os amigos, com uma boa comida e um bom vinho, além, é claro, de ficar com a família, rodeado pelos netos.

Sempre mesclou a quase obsessão pelo trabalho com a alma singela dos antepassados italianos. Era assíduo nas missas de domingo pela manhã na Igreja do Pio X, sobretudo nos tempos do padre Ênio Tarasconi. A simplicidade e a determinação de Raul o transformaram em um sonhador realizador, definiu o filho David.

Olhos no futuro

Seu Raul sempre fez planos para o futuro. Durante uma entrevista em 2009, deu pistas que, mesmo aos 80 anos, projetava longe: “acho que tínhamos de viver 150 anos. Tem muita coisa ainda pra fazer”.

Sempre descrito como um homem com intensa necessidade de fazer algo para melhorar a vida em sociedade. E era reconhecido por uma capacidade de mobilizar as pessoas em momentos difíceis. Um líder.

Adorava as coisas simples da vida, mas tomava algumas precauções por causa da posição que conquistou, como andar em carro blindado, com alarme. Já teve o Rolex roubado em São Paulo, mas não deixou de usar a marca de relógios, seu acessório favorito.

Quem o conheceu na intimidade destaca a serenidade e o otimismo com que conduziu as mais variadas situações do dia a dia. Dentro do lar, sempre contou com a parceria de dona Nilva. A presença dela conferia ao empresário o esteio e a força necessários para seguir em frente. Da relação familiar, surgiu outro legado deixado por Raul Randon: a generosidade. Os filhos e netos costumam reproduzir o padrão de afetividade e simplicidade com que o patriarca costumava levar a vida.

Seu Raul gostava de fazer festas para os funcionários e promovia cavalgadas em seus aniversários. Tirava fôlego da prática da natação e costumava contar que chegou a nadar mil metros em 20 minutos, sem pausa para as braçadas. Ao chegar em casa, depois do trabalho, assistia às novelas das nove e relatava ter ouvido muitas histórias que dariam bons roteiros de ficção.

Teve a própria história retratada em livro, Os Olhos de Quem Vê, e em filme, Viver e Acreditar, gravado em segredo. Seu Raul foi avisado apenas pouco antes do lançamento do filme, em agosto passado, no cinema do shopping Iguatemi.

Era reconhecido pela excelente memória. Trazia na ponta da língua todos os números referentes às empresas. Sabia quanto produzem, quanto gastam, quanto recebem e quanto podem investir. Na ativa, cobrava números e datas de conclusão de projetos acordados.

Seu Raul nunca pensou pequeno, e talvez aí esteja uma das razões do sucesso de seus empreendimentos e de sua vida.

– O que a gente faz feliz, não cansa – disse, assertivamente.

Negócios sempre ligados à família

“Continuem a obra, sempre unidos!”, pediu o patriarca

A continuidade dos negócios da família pelos filhos era uma preocupação de Raul Randon. A vontade de vê-los dando sequência ao empreendimento de sua vida certamente era repetida no dia a dia. Tanto que, em abril de 2009, quando deixou a presidência da empresa, pediu que o cargo ficasse com um dos filhos. David, o mais velho dos cinco – Maurien, Alexandre, Roseli e Daniel completam o quinteto – assumiu o posto do pai, atendendo ao seu desejo.

A vontade de que os filhos não deixassem ter fim aquilo que ele deu início com tanto esforço e dedicação foi expressa também nas páginas do Pioneiro. Em uma entrevista ao colunista João Pulita, publicada no Almanaque dos dias 15 e 16 de agosto de 2009, ao ser questionado sobre qual mensagem gostaria de deixar, ele respondeu que era dirigida para a família: “Continuem a obra, sempre unidos!”

O negócio, criado para garantir o sustento da família Randon, tornou-se uma potência e garantiu emprego de muitas famílias caxienses e de fora também, que viram na empresa uma chance de trabalho. Mais de uma geração viu na Randon a oportunidade de sucesso profissional.

Apaixonado

O sucesso da empresa exigiu um pouco de “sacrifício” da família. Raul e Nilva D’Agostini se casaram em 3 de março de 1956 (coincidentemente no mesmo dia da morte de Raul). Na segunda-feira, ele já foi trabalhar. A fábrica era pequena e Raul precisava ajudar o irmão Hercílio. O jovem casal ficou sem lua de mel.

– Nos casamos e meu cunhado resolveu tirar férias. Para nós, estava bom, casando estava bom! Se fosse hoje, não daria certo, mas naquela época a gente achou que tudo bem. Fomos viajar um mês depois, para Santa Catarina, visitar os parentes. Viajamos de trem. Tudo valeu. Naquela época não se falava: “Ah! Foram passar lua de mel lá em... Aquilo era secundário. A maioria não tinha lua de mel fora de casa, porque tinha que trabalhar. As coisas não eram fáceis – lembrou Nilva, em uma entrevista.

Nas bodas de ouro, também não houve viagem. Na segunda-feira seguinte à festa de 50 anos de casados, que ocorreu num sábado, Raul foi trabalhar.

A história foi contada aos risos pelos dois na edição de 13 e 14 de maio de 2006 do Almanaque. Na mesma reportagem, Raul lembrou com carinho de como conheceu a esposa. Foi em uma ida a Flores da Cunha para assistir a um jogo de futebol.

– Como não ia olhar para uma morena linda como ela? – disse, na época.

O homem que recebeu dezenas de distinções ao longo da vida, como o Mérito Farroupilha, considerou, naquela entrevista ao colunista João Pulita, a mais importante uma que envolve justamente Nilva: a bênção do papa Bento XVI por ocasião das bodas de ouro. Mais uma prova do amor de seu Raul pela mulher e pela família.

Na intimidade, pai amoroso

Empresário modelo, reconhecido pela veia empreendedora, Raul Randon também era um marido dedicado, um pai afetivo e um irmão zeloso com o crescimento dos familiares. Ao lado da mulher, Nilva D’Agostini Randon, sempre tentou se manter próximo dos entes queridos.

Depoimentos da família no documentário Viver e Acreditar, sobre a trajetória dele, dão conta desse lado mais íntimo do empreendedor.

– Eles formaram um casal bem completo. Então, a mãe, como administradora do lar, sempre foi fantástica e claro, os dois sempre tiveram regras e ela as mantinha, mesmo ele estando ou não estando ali com os filhos. Quando ele estava junto, a gente tinha que ficar mais em silêncio...Para ele ouvir o rádio, ler notícias, ver o jornal – recorda a filha Roseli.

Dona Nilva lembra que o marido nunca foi de levar problemas da empresa para dentro do lar:

– Ele chegava em casa, principalmente quando tinha as crianças, às vezes ele vinha com as preocupações, não falava muito, mas era participativo. Tinha as minhas cunhadas, que às vezes entravam nas oficinas com as crianças, quando os nossos filhos eram pequenos, com eles no colo e ele os pegava e dava aqueles beijões. Todo mundo dizia que ele era carinhoso. Ele era um bom pai.

A filha Maurien evoca na memória os rituais do pai antes de sair de casa:

– Minha lembrança é de quando ele saía do banho, tomava o café para ir trabalhar. Ele se perfumava muito, até hoje ele gosta de usar perfume. Eu sabia que o cheiro ficava ali pelos quartos, pela sala... Eu lembro que ele e minha mãe tinham uma combinação: até ele não chegar ninguém almoçava. Então, a gente ligava pro escritório e dizia: pai, que horas o senhor vem almoçar? E ficava ligando desde 11h45min até 12h30min.

O que derrubou o GIGANTE

Hospitalizado para colocar um pino entre o fêmur e a bacia, empresário ficou internado 90 dias e teve parada cardíaca
Não foi o coração frágil que derrubou o gigante cuja trajetória foi sintetizada nas páginas anteriores. Se há anos Raul Randon precisava de cuidados constantes por conta de uma insuficiência cardíaca, foram as fortes dores na coluna que exigiram uma atenção maior dos médicos nos últimos tempos.

Entre outubro e novembro do ano passado, seu Raul esteve hospitalizado duas vezes no Hospital São Francisco da Santa Casa de Misericórdia, em Porto Alegre. Numa das ocasiões, foi submetido a uma infiltração nas raízes nervosas para aliviar a dor. No dia 3 dezembro, foi internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, para implantar um pino entre a bacia e o fêmur. Até novembro, ele teve o acompanhamento direto do amigo e cardiologista Fernando Lucchese. Com a partida de seu Raul para São Paulo, Lucchese só monitorou a saúde do empresário à distância.

– Era um homem forte, mas obviamente dependia de muitos cuidados. Em outubro, precisou fazer uma intervenção no esôfago. Logo após, foi realizada a infiltração nas raízes nervosas. Ficava quatro ou cinco dias hospitalizado em cada vez. Quando foi a São Paulo, acabei não tendo esse acompanhamento direto – diz o médico.

Após passar por uma cirurgia no Albert Einstein, a opção da equipe médica foi manter o empresário internado.

Família se manteve confiante

No começo de fevereiro, o filho mais velho, David Randon, informou ao Pioneiro que o pai passava por uma recuperação lenta após a cirurgia no fêmur, pois havia sido uma intervenção muito delicada. David contou que o pai ficou fraco, pegou uma bactéria, mas que já se encontrava recuperado. A expectativa do filho era de que, na metade de fevereiro, o pai viesse direto do hospital em São Paulo para casa, em Caxias do Sul. David revelou que o pai fazia caminhadas com andador pelo Albert Einstein e que, para receber a alta, precisava apenas estar apto a se apoiar na bengala. “Ainda brincamos com ele que chegava de férias”, contou, à época, David.

Nos últimos 40 dias, porém, a saúde de Randon declinou. Ele acumulou água no pulmão, teve complicações no rim e no fígado e precisou passar por sessões de hemodiálise. Apesar de tudo e até o último dia, a família manteve a esperança de que patriarca retornaria para Caxias do Sul.

Ainda nesta semana, a informação da família era de que o empresário estava consciente, conversando, e que, apesar de estar passando por hemodiálise, estava se recuperando e em vias de retornar para casa. Contudo, quando se trata de insuficiência cardíaca, a condição de um paciente como Raul Randon é sempre delicada.

– Foi há uns 20 anos que fiz uma cirurgia nas artérias coronárias do Raul. Alguns anos depois, implantamos um desfibrilador no coração, o que lhe ajudou a sobreviver a paradas cardíacas – revela Lucchese.

Desde que Raul Randon esteve internado em São Paulo, em dezembro, a esposa, dona Nilva, permaneceu ao lado dele. Segundo uma das noras, ela veio para Caxias por dois dias e teve de voltar às pressas, pois não conseguia ficar distante do companheiro de mais de 60 anos.

Nesta semana, além de Nilva, seu Raul também teve a companhia dos filhos Alexandre, Daniel e Roseli e do neto Raul. Na manhã de sábado, os três filhos de Daniel estiveram com o avô em São Paulo e se divertiram com ele. No final da tarde, porém, o empresário estava no quarto do hospital ao lado do neto Raul quando sofreu uma parada cardíaca. A equipe médica decidiu entubar o empresário. Por volta das 21h, apesar dos esforços médicos, o resistente coração de seu Raul parou para sempre.

COM A PALAVRA, SEU RAUL

É um povo que colabora em tudo. Caxias será sempre o futuro.”

Maio de 1988, quando recebeu o título de Cidadão Caxiense

Para que vou ficar em casa? Para ver televisão?”

Abril de 1999

Nada cai do céu.

Tem que trabalhar, enfrentar as dificuldades. Antes de produzir algo,

tem que estudar

bem o que vai fazer.”

Fevereiro de 2001

Se não tivéssemos investido na fabricação de carretas lá nos anos 70, não faríamos 1,5 mil carretas por mês hoje.”

Abril de 2005

Essa homenagem é

uma alegria enorme, porque gosto muito e sempre apoiei o tradionalismo.”

Agosto de 2008, sobre a 1ª Cavalgada Raul Anselmo Randon

Se eu fico um dia

longe da fábrica, eu sinto saudade. Tenho que pegar o carro e dar uma voltinha, só para ver se está tudo funcionando. Eu sempre gostei de trabalhar

alegre, bem disposto.

Acho que todo mundo tem

obrigação de trabalhar.”

Agosto de 2009

Eu só faço o que

tem de ser feito.

Nem mais, nem menos.”

Maio de 2010, quando perguntado pelo Pioneiro se tinha noção da personalidade que ele era

“Ainda bem que

inventaram o trabalho, assim sempre tem novidade.”

Julho de 2010

No começo, eu só

queria fazer um vinho para comemorar minhas bodas de ouro, mas a Miolo quis fazer mais garrafas e eu fui tomando gosto pela brincadeira.’’

Agosto de 2011

Sempre gostei da

minha vida, se preciso, faria tudo de novo e igual.”

Novembro de 2012

Meu partido

é a Randon.”

Maio de 2013, respondendo ao Pioneiro se tinha partido político

Existem duas coisas

no mundo que nunca

vão terminar: o

transporte e a comida.”

Novembro de 2014

“Costumam dizer: ‘onde o Raul bota a mão vira ouro’. Mas isso é a longo prazo. No início, alguns negócios podem dar prejuízo. O único que virou ouro mesmo é o Florescer. Os outros são materiais. Esses jovens poderiam estar no vício. Não estamos salvando todos, mas alguns estão salvos.”

Março de 2017

Sou uma pessoa que poucas vezes sentou no banco do colégio. Mas sentei no banco do trabalho.”

Junho de 2017

A gente sempre tem

coisas para fazer, queira ou não queira. Se eu tenho que fazer um negócio que tem que ser financiado 20 anos para a frente, eu faço. O dia em que eu faltar, estará continuando, não é? A gente não pode parar. Eu acho que a vida é assim.”

Agosto de 2017, em depoimento no filme Viver e Acreditar