Deixe de lado conceitos prévios: a série não é simplesmente naves e robôs. É um mundo em que arquitetos, advogados, etc, se veem como parte de uma jornada
Na saída de uma audiência no Fórum de Farroupilha, na manhã da última quinta-feira, a advogada Karine Trott, 40 anos, conseguiu tirar um tempinho para responder, por telefone, como seria se a saga Star Wars jamais tivesse sido concebida.
– Possivelmente eu poderia ter outros heróis. Sou mãe de dois meninos e acabei descobrindo recentemente o mundo dos Vingadores, da Liga da Justiça, acendeu aquela chaminha pelos super-heróis, sabe? Peraí, ainda bem que existe Star Wars, não é? – devolve Karine, levemente apreensiva pelo fato de ainda não ter recebido o cosplay da personagem Rey encomendado há dois meses de uma loja de Curitiba (PR).
– Espero que as roupas cheguem a tempo para a pré-estreia do filme (Os Últimos Jedi) – torce a advogada.
Corta a cena para os corredores do campus da Universidade Anhembi Morumbi, no Parque da Mooca, em São Paulo, a exatos 1.016 quilômetros do Fórum de Farroupilha. Entre uma aula e outra, o professor de Linguagem Cinematográfica e Montagem Vebis Stevanin Junior, 41, envia áudios de WhatsApp para dizer que a ausência dos heróis de Star Wars só poderia ser preenchida pelo anarquista Snake Plissken do apocalíptico Fuga de Nova York, de 1981.
– É a ideia de precisarem de um anti-herói para salvar o mundo que me cativa – justifica Vebis, um dos integrantes do grupo Sociedade Jedi, site criado e mantido por voluntários de seis Estados, incluindo o Rio Grande do Sul, para divulgar novidades sobre a série espacial e seus derivados.
Volta para a Serra. Não há negociação para o microempresário Daniel Souza dos Santos, 37. Enquanto confere as fotos em que posou como modelo de stormtrooper na passarela do campus-sede da Universidade de Caxias do Sul (UCS), ele garante:
– Meu herói seria o He-Man. Brincadeira! Provavelmente, não teria outra saga que eu seria fã.
É difícil imaginar qual obra cinematográfica de Hollywood ocuparia hoje o pódio que a aventura espacial conquistou ainda no verão de 1977, caso o cineasta George Lucas tivesse desistido de tocar uma ideia considerada ridícula por parte do elenco e dos produtores. Se o primeiro filme chegou desacreditado aos cinemas, hoje muita gente se debruça em teorias e fatos para tentar entender o que move os milhões de fãs de Luke Skywalker, de Darth Vader, de Han Solo e companhia, muitos deles em Caxias e região.
De cidades e formações diferentes, Daniel, Vebis e Karine, por exemplo, carregam o mesmo sentimento de pertencimento a um universo cheio de referências, a mesma sensação que embala outras culturas mundo afora. São pessoas que sentem arrepios com a aproximação do lançamento de Os Últimos Jedi, continuação da franquia bilionária retomada em 2015 pela Disney. O filme chega aos cinemas de Caxias do Sul na próxima quinta-feira, dia 14.
– Star Wars é só um filme tanto quanto Grêmio e Inter são apenas times. Quem está fora não compreende essa imaginabilidade, é uma cultura autônoma. De modo geral, Star Wars surgiu como o renascimento do cinema que estava em baixa (final dos anos 1970) e trouxe o componente de reativar a questão mitológica. Ali está o pai ausente, as surpresas que o destino nos coloca – analisa Caetano Sordi, professor de antropologia da UCS.
Quem não foi fisgado pelo espírito da saga, portanto, estranha a euforia e o apego. Pergunte para o operador de produção Lyno Cueva Flores, 45, por que é legal ir um pouco além e usar um manto jedi, vestir a roupa do Darth Vader ou brandir um sabre de luz de brinquedo.
– Tu te sente uma celebridade – resume Lyno, que admite a emoção de ver o filho Paulo, 12, encarnar o personagem Jawa.
Daniel, um dos cosplayers que topou fazer o ensaio fotográfico que ilustra as páginas desta reportagem, teve até pedidos para fazer selfies com estudantes da UCS. O empresário Felipe Brino Oliveira, 36, dono de uma a armadura de Darth Vader, agitou a Estação Principal de Integração (EPI) Floresta durante outra sessão de fotos.
– Por onde passo com essa roupa sempre causo tumulto – diverte-se.
Tente observar no cinema. Se uma cena mais emocional do novo filme dirigido por Rian Johnson casar com a trilha composta pelo premiadíssimo John Williams, é bem possível que algum marmanjo lacrimeje no escuro do cinema.
Programe-se
A segunda parte da nova trilogia da aventura espacial chega aos cinemas de Caxias do Sul e da região na quinta-feira, dia 14. No primeiro minuto da madrugada de quinta-feira, haverá sessões de pré-estreia de Os Últimos Jedi no GNC Cinemas do Shopping Iguatemi e no Cinépolis do Shopping San Pelegrino, em Caxias do Sul.
No Cinépolis, a animação antes da sessão ficará por conta do Posto Avançado Caxias Star Wars. Às 19h, os cosplayers já estarão no local com as fantasias dos personagens dos filmes.
Uma verdadeira novela
Você pode torcer Star Wars como se fosse um pano molhado e não espremerá uma gota que defina exatamente que liga é essa que une pessoas em torno de um enredo sobre as tentações da escuridão e da luz. Ou você ainda acha que se trata apenas de naves espaciais e robôs?
– Uma das diferenças de Star Wars é a mistura de elementos de folhetim como “quem é meu pai?”, “qual é minha verdadeira identidade?”, comédia e um misticismo pop que move a luta do bem contra o mal. Esses elementos foram organizados por George Lucas a partir de estudos sobre arquétipos humanos, uma espécie de características psicológicas que estão presentes na vida de todos – aponta Roberto Tietzmann, professor da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS.
Para o professor, é fácil renovar as plateias a cada filme, pois sempre haverá um elemento para fascinar quem se aproxima da saga pela primeira vez. A avaliação de Tietzmann é complementada pelo jornalista e professor de comunicação da Faculdade da América Latina Nivaldo Pereira, que cita a obra do falecido mitologista Joseph John Campbell, fonte que alimentou George Lucas durante a concepção de Star Wars nos anos 1970.
– Apesar da roupagem futurista e intergaláctica, o segredo de Star Wars é a estrutura do roteiro, que contempla todas as etapas da jornada do herói. Também passamos por essa jornada na vida. Todo dia somos apresentados a um desafio, que nos tira da zona de conforto, nos deixa em dúvida se teremos como prosseguir e superar. No fim do dia, voltamos para casa com a missão cumprida. O George Lucas captou isso e concebeu a saga gigantesca. Então, nos reconhecemos na história, nos personagens – explica Nivaldo.
Não tão apegado a teorias, o analista de sistemas Rafael Pedó, 38, conheceu a série ainda criança numa sessão da tarde qualquer e hoje virou referência em Caxias do Sul e Farroupilha por ser um dos fundadores do Posto Avançado Caxias (PAC), unidade ligada ao Conselho Jedi RS. A fantasia de Rey que ainda não chegou na casa da advogada Karine, por exemplo, é uma das peças que falta para fechar esse time que congrega cosplayers e admiradores mais discretos da fábula de George Lucas. Pedó lamenta não ter ainda uma sede para o PAC, mas o grupo já reúne 30 integrantes, e os últimos dois anos têm sido interessantes, pois o retorno dos filmes só aumentou o engajamento. – A criança é inocente, tu não escolhe o que vai gostar. É a tal da ficção, de um mundo que não existe, da história em si – define Pedó sobre a paixão de infância. Quem desconhece esse universo pende para dois caminhos: fica indiferente ou irritado com o ardor dos fãs. Em 2015, no auge da divulgação de O Despertar da Força, o racismo e o machismo explodiram nas redes sociais tão somente porque a protagonista era uma mulher (Daisy Ridley) e o parceiro de cena era um negro (John Boyega). O festival de ódio, com direito a um fracassado boicote ao filme, ainda não passou e até hoje tem hater xingando Daisy Ridley, intérprete de Rey. A atriz cansou de tanta gente chata e abandonou as redes sociais.
Os moderadores do Facebook da Sociedade Jedi também enfrentam preconceituosos. Vebis indica a leitura das avaliações de alguns leitores na página do grupo e provoca: – Viu como a onda reacionária cega? Por outro lado, tem muita gente torcendo para que o universo dos jedi apresente uma personagem LGBT pela primeira vez. Seria um ponto a favor para o cinema de massas, já que as grandes franquias tristemente ainda fazem esse tipo de exclusão. Para Tietzmann, a diversidade na série vem melhorando. – O filme de 1977 praticamente só tem a princesa Leia como personagem feminina em destaque. Na hora de revelar os planos de ataque à Estrela da Morte, todos os pilotos são brancos e homens. Os filmes mais recentes são liderados por uma jovem branca e um rapaz negro, uma renovação de personagens e elenco muito bem-vinda – observa Tietzmann.
O preconceito envolvendo Star Wars não é reflexo dos dias atuais. O corretor de imóveis Nilso Antônio Bevilaqua, 52, amigo de Rafael e fundador do PAC, lembra como era difícil demonstrar abertamente o amor pelos filmes sem ser alvo de chacotas no início dos anos 1980. Hoje, ele não tem receio de se exibir com uma armadura do Boba Fett. – Alguém sempre fazia piadinha. Mas mudou, tem mais aceitação. Por outro lado, quem pratica o racismo e fala mal da Daisy não é fã de Star Wars, é outra coisa. Aliás, foi bom ter ela no filme. É magrinha, mas poderosa na força – exalta Nilso. E que força. A advogada Karine sente um arrepio quando se dá conta de que o poder invisível dos jedis, principal elemento da fantasia, é perceptível na vida real. Obviamente, de outra forma. – A força está na gente, no dia a dia. Nossos pensamentos podem ser melhores ou piores – pondera Karine, que se identifica mais com Darth Vader. Esqueça todos os dilemas e paixões. Se você não conhece a saga, vá ao cinema e curta Star Wars apenas como um filme divertido. Agora, se for fisgado pela magia, tenha certeza que a jornada será épica.
Jedi solidário
O PAC Caxias participa da ação Levando o Natal para onde o Papai Noel se esquece de passar. O grupo pede a doação de brinquedos. A ação ocorre na Casa do Papai Noel na Rua Quatorze de Julho, 878, no centro de Farroupiha, das 14h às 17h30min
Nora foi além e construiu robôs
Mitologias à parte, Star Wars é antes de tudo entretenimento que permite experiências de luxo. O consultor de Tecnologia da Informação Airton Nora, 52, construiu réplicas perfeitas de um ícone da saga e de um recém-chegado ao universo espacial: os droides R2-D2 e BB8, respectivamente. Eles rodam, emitem sons e luz igualizando o filme.
A primeira réplica do R2 foi fabricada especialmente para o aniversário de 15 anos de Gabriela, filha de Nora.
– O robô entrou na festa, que tinha toda a temática de filmes, trazendo o anel de aniversário há uns cinco anos. Depois, fiz um novo R2 em tamanho natural – conta Nora.
Mais difícil foi a confecção do BB8, já que é um modelo no formato de uma bola. Nora usou materiais recicláveis como madeira e plástico, além de comprar lâmpadas LED e tinta para o acabamento para fazer os dois robôs. Com a ajuda da plataforma eletrônica arduino, ele fez a programação dos brinquedos. O R2 é controlado pelo celular. BB8, por sua vez, obedece aos comandos por meio de rádio controle adaptado de outro brinquedo. Calcule o sucesso dos droides em eventos temáticos.
– A motivação de estar num grupo como o PAC é justamente o filme. Isso nos leva a eventos como Jedicon. Vêm criancinha e pessoas de 80 anos que também curtem, é muito legal – anima-se Nora.
Quer ver a criação de Nora? Os robôs estarão na pré-estreia de Os Últimos Jedi na noite de quarta-feira no Cinépolis.
Pop
Entenda a linha do tempo de Star Wars e seu impacto na cultura pop mundial
Trilogia original
Inclui os filmes Uma Nova Esperança (1977), O Império Contra-Ataca (1980) e O Retorno de Jedi (1983). A obra de 1977 quase causou histeria e mudou mesmo história do cinema, tornando-se a terceira maior bilheteria de todos os tempos (ajustada pela inflação, perdeu o posto de segunda lugar para Avatar, que está atrás do líder E o Vento Levou). Na época, houve quem comparasse o filme como uma representação do nazismo e do comunismo. Em algumas sessões nos Estados Unidos, o interesse do público era tão grande que obrigava a polícia a montar esquemas para dispersar a multidão na frente dos cinemas. Nascia ali a era dos blockbusters (produção com efeitos especiais para arrastar multidões) e dos produtos agregados (venda de bonecos, revistas, games e roupas).
Trilogia prelúdio
Inclui os filmes A Ameaça Fantasma (1999), O Ataque dos Clones (2002) e A Vingança dos Sith. A Ameaça Fantasma foi um gigantesco evento midiático e um dos filmes mais esperados da história. Contudo, essa produção e as duas sequências decepcionaram fãs e críticos por terem uma narrativa com furos no roteiro, interpretações ruins dos atores e efeitos artificiais demais. A trama se passa antes dos eventos da trilogia original. Os fãs mais radicais inclusive se viraram contra George Lucas.
Nova trilogia
É a retomada de Star Wars sob o controle da Disney, que adquiriu os direitos da saga de George Lucas em 2012. Em 2015, foi lançado O Despertar da Força, que conta a história após os eventos da trilogia original. Com os novos filmes, a Disney anunciou a produção de produções paralelas, os chamados spin-off. O primeiro deles, Rogue One, foi lançado em 2016 e o próximo é Solo, programado para 2018.
Na saída de uma audiência no Fórum de Farroupilha, na manhã da última quinta-feira, a advogada Karine Trott, 40 anos, conseguiu tirar um tempinho para responder, por telefone, como seria se a saga Star Wars jamais tivesse sido concebida.
– Possivelmente eu poderia ter outros heróis. Sou mãe de dois meninos e acabei descobrindo recentemente o mundo dos Vingadores, da Liga da Justiça, acendeu aquela chaminha pelos super-heróis, sabe? Peraí, ainda bem que existe Star Wars, não é? – devolve Karine, levemente apreensiva pelo fato de ainda não ter recebido o cosplay da personagem Rey encomendado há dois meses de uma loja de Curitiba (PR).
– Espero que as roupas cheguem a tempo para a pré-estreia do filme (Os Últimos Jedi) – torce a advogada.
Corta a cena para os corredores do campus da Universidade Anhembi Morumbi, no Parque da Mooca, em São Paulo, a exatos 1.016 quilômetros do Fórum de Farroupilha. Entre uma aula e outra, o professor de Linguagem Cinematográfica e Montagem Vebis Stevanin Junior, 41, envia áudios de WhatsApp para dizer que a ausência dos heróis de Star Wars só poderia ser preenchida pelo anarquista Snake Plissken do apocalíptico Fuga de Nova York, de 1981.
– É a ideia de precisarem de um anti-herói para salvar o mundo que me cativa – justifica Vebis, um dos integrantes do grupo Sociedade Jedi, site criado e mantido por voluntários de seis Estados, incluindo o Rio Grande do Sul, para divulgar novidades sobre a série espacial e seus derivados.
Volta para a Serra. Não há negociação para o microempresário Daniel Souza dos Santos, 37. Enquanto confere as fotos em que posou como modelo de stormtrooper na passarela do campus-sede da Universidade de Caxias do Sul (UCS), ele garante:
– Meu herói seria o He-Man. Brincadeira! Provavelmente, não teria outra saga que eu seria fã.
É difícil imaginar qual obra cinematográfica de Hollywood ocuparia hoje o pódio que a aventura espacial conquistou ainda no verão de 1977, caso o cineasta George Lucas tivesse desistido de tocar uma ideia considerada ridícula por parte do elenco e dos produtores. Se o primeiro filme chegou desacreditado aos cinemas, hoje muita gente se debruça em teorias e fatos para tentar entender o que move os milhões de fãs de Luke Skywalker, de Darth Vader, de Han Solo e companhia, muitos deles em Caxias e região.
De cidades e formações diferentes, Daniel, Vebis e Karine, por exemplo, carregam o mesmo sentimento de pertencimento a um universo cheio de referências, a mesma sensação que embala outras culturas mundo afora. São pessoas que sentem arrepios com a aproximação do lançamento de Os Últimos Jedi, continuação da franquia bilionária retomada em 2015 pela Disney. O filme chega aos cinemas de Caxias do Sul na próxima quinta-feira, dia 14.
– Star Wars é só um filme tanto quanto Grêmio e Inter são apenas times. Quem está fora não compreende essa imaginabilidade, é uma cultura autônoma. De modo geral, Star Wars surgiu como o renascimento do cinema que estava em baixa (final dos anos 1970) e trouxe o componente de reativar a questão mitológica. Ali está o pai ausente, as surpresas que o destino nos coloca – analisa Caetano Sordi, professor de antropologia da UCS.
Quem não foi fisgado pelo espírito da saga, portanto, estranha a euforia e o apego. Pergunte para o operador de produção Lyno Cueva Flores, 45, por que é legal ir um pouco além e usar um manto jedi, vestir a roupa do Darth Vader ou brandir um sabre de luz de brinquedo.
– Tu te sente uma celebridade – resume Lyno, que admite a emoção de ver o filho Paulo, 12, encarnar o personagem Jawa.
Daniel, um dos cosplayers que topou fazer o ensaio fotográfico que ilustra as páginas desta reportagem, teve até pedidos para fazer selfies com estudantes da UCS. O empresário Felipe Brino Oliveira, 36, dono de uma a armadura de Darth Vader, agitou a Estação Principal de Integração (EPI) Floresta durante outra sessão de fotos.
– Por onde passo com essa roupa sempre causo tumulto – diverte-se.
Tente observar no cinema. Se uma cena mais emocional do novo filme dirigido por Rian Johnson casar com a trilha composta pelo premiadíssimo John Williams, é bem possível que algum marmanjo lacrimeje no escuro do cinema.
Programe-se
A segunda parte da nova trilogia da aventura espacial chega aos cinemas de Caxias do Sul e da região na quinta-feira, dia 14. No primeiro minuto da madrugada de quinta-feira, haverá sessões de pré-estreia de Os Últimos Jedi no GNC Cinemas do Shopping Iguatemi e no Cinépolis do Shopping San Pelegrino, em Caxias do Sul.
No Cinépolis, a animação antes da sessão ficará por conta do Posto Avançado Caxias Star Wars. Às 19h, os cosplayers já estarão no local com as fantasias dos personagens dos filmes.
Uma verdadeira novela
Você pode torcer Star Wars como se fosse um pano molhado e não espremerá uma gota que defina exatamente que liga é essa que une pessoas em torno de um enredo sobre as tentações da escuridão e da luz. Ou você ainda acha que se trata apenas de naves espaciais e robôs?
– Uma das diferenças de Star Wars é a mistura de elementos de folhetim como “quem é meu pai?”, “qual é minha verdadeira identidade?”, comédia e um misticismo pop que move a luta do bem contra o mal. Esses elementos foram organizados por George Lucas a partir de estudos sobre arquétipos humanos, uma espécie de características psicológicas que estão presentes na vida de todos – aponta Roberto Tietzmann, professor da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS.
Para o professor, é fácil renovar as plateias a cada filme, pois sempre haverá um elemento para fascinar quem se aproxima da saga pela primeira vez. A avaliação de Tietzmann é complementada pelo jornalista e professor de comunicação da Faculdade da América Latina Nivaldo Pereira, que cita a obra do falecido mitologista Joseph John Campbell, fonte que alimentou George Lucas durante a concepção de Star Wars nos anos 1970.
– Apesar da roupagem futurista e intergaláctica, o segredo de Star Wars é a estrutura do roteiro, que contempla todas as etapas da jornada do herói. Também passamos por essa jornada na vida. Todo dia somos apresentados a um desafio, que nos tira da zona de conforto, nos deixa em dúvida se teremos como prosseguir e superar. No fim do dia, voltamos para casa com a missão cumprida. O George Lucas captou isso e concebeu a saga gigantesca. Então, nos reconhecemos na história, nos personagens – explica Nivaldo.
Não tão apegado a teorias, o analista de sistemas Rafael Pedó, 38, conheceu a série ainda criança numa sessão da tarde qualquer e hoje virou referência em Caxias do Sul e Farroupilha por ser um dos fundadores do Posto Avançado Caxias (PAC), unidade ligada ao Conselho Jedi RS. A fantasia de Rey que ainda não chegou na casa da advogada Karine, por exemplo, é uma das peças que falta para fechar esse time que congrega cosplayers e admiradores mais discretos da fábula de George Lucas. Pedó lamenta não ter ainda uma sede para o PAC, mas o grupo já reúne 30 integrantes, e os últimos dois anos têm sido interessantes, pois o retorno dos filmes só aumentou o engajamento. – A criança é inocente, tu não escolhe o que vai gostar. É a tal da ficção, de um mundo que não existe, da história em si – define Pedó sobre a paixão de infância. Quem desconhece esse universo pende para dois caminhos: fica indiferente ou irritado com o ardor dos fãs. Em 2015, no auge da divulgação de O Despertar da Força, o racismo e o machismo explodiram nas redes sociais tão somente porque a protagonista era uma mulher (Daisy Ridley) e o parceiro de cena era um negro (John Boyega). O festival de ódio, com direito a um fracassado boicote ao filme, ainda não passou e até hoje tem hater xingando Daisy Ridley, intérprete de Rey. A atriz cansou de tanta gente chata e abandonou as redes sociais.
Os moderadores do Facebook da Sociedade Jedi também enfrentam preconceituosos. Vebis indica a leitura das avaliações de alguns leitores na página do grupo e provoca: – Viu como a onda reacionária cega? Por outro lado, tem muita gente torcendo para que o universo dos jedi apresente uma personagem LGBT pela primeira vez. Seria um ponto a favor para o cinema de massas, já que as grandes franquias tristemente ainda fazem esse tipo de exclusão. Para Tietzmann, a diversidade na série vem melhorando. – O filme de 1977 praticamente só tem a princesa Leia como personagem feminina em destaque. Na hora de revelar os planos de ataque à Estrela da Morte, todos os pilotos são brancos e homens. Os filmes mais recentes são liderados por uma jovem branca e um rapaz negro, uma renovação de personagens e elenco muito bem-vinda – observa Tietzmann.
O preconceito envolvendo Star Wars não é reflexo dos dias atuais. O corretor de imóveis Nilso Antônio Bevilaqua, 52, amigo de Rafael e fundador do PAC, lembra como era difícil demonstrar abertamente o amor pelos filmes sem ser alvo de chacotas no início dos anos 1980. Hoje, ele não tem receio de se exibir com uma armadura do Boba Fett. – Alguém sempre fazia piadinha. Mas mudou, tem mais aceitação. Por outro lado, quem pratica o racismo e fala mal da Daisy não é fã de Star Wars, é outra coisa. Aliás, foi bom ter ela no filme. É magrinha, mas poderosa na força – exalta Nilso. E que força. A advogada Karine sente um arrepio quando se dá conta de que o poder invisível dos jedis, principal elemento da fantasia, é perceptível na vida real. Obviamente, de outra forma. – A força está na gente, no dia a dia. Nossos pensamentos podem ser melhores ou piores – pondera Karine, que se identifica mais com Darth Vader. Esqueça todos os dilemas e paixões. Se você não conhece a saga, vá ao cinema e curta Star Wars apenas como um filme divertido. Agora, se for fisgado pela magia, tenha certeza que a jornada será épica.
Jedi solidário
O PAC Caxias participa da ação Levando o Natal para onde o Papai Noel se esquece de passar. O grupo pede a doação de brinquedos. A ação ocorre na Casa do Papai Noel na Rua Quatorze de Julho, 878, no centro de Farroupiha, das 14h às 17h30min
Nora foi além e construiu robôs
Mitologias à parte, Star Wars é antes de tudo entretenimento que permite experiências de luxo. O consultor de Tecnologia da Informação Airton Nora, 52, construiu réplicas perfeitas de um ícone da saga e de um recém-chegado ao universo espacial: os droides R2-D2 e BB8, respectivamente. Eles rodam, emitem sons e luz igualizando o filme.
A primeira réplica do R2 foi fabricada especialmente para o aniversário de 15 anos de Gabriela, filha de Nora.
– O robô entrou na festa, que tinha toda a temática de filmes, trazendo o anel de aniversário há uns cinco anos. Depois, fiz um novo R2 em tamanho natural – conta Nora.
Mais difícil foi a confecção do BB8, já que é um modelo no formato de uma bola. Nora usou materiais recicláveis como madeira e plástico, além de comprar lâmpadas LED e tinta para o acabamento para fazer os dois robôs. Com a ajuda da plataforma eletrônica arduino, ele fez a programação dos brinquedos. O R2 é controlado pelo celular. BB8, por sua vez, obedece aos comandos por meio de rádio controle adaptado de outro brinquedo. Calcule o sucesso dos droides em eventos temáticos.
– A motivação de estar num grupo como o PAC é justamente o filme. Isso nos leva a eventos como Jedicon. Vêm criancinha e pessoas de 80 anos que também curtem, é muito legal – anima-se Nora.
Quer ver a criação de Nora? Os robôs estarão na pré-estreia de Os Últimos Jedi na noite de quarta-feira no Cinépolis.
Pop
Entenda a linha do tempo de Star Wars e seu impacto na cultura pop mundial
Trilogia original
Inclui os filmes Uma Nova Esperança (1977), O Império Contra-Ataca (1980) e O Retorno de Jedi (1983). A obra de 1977 quase causou histeria e mudou mesmo história do cinema, tornando-se a terceira maior bilheteria de todos os tempos (ajustada pela inflação, perdeu o posto de segunda lugar para Avatar, que está atrás do líder E o Vento Levou). Na época, houve quem comparasse o filme como uma representação do nazismo e do comunismo. Em algumas sessões nos Estados Unidos, o interesse do público era tão grande que obrigava a polícia a montar esquemas para dispersar a multidão na frente dos cinemas. Nascia ali a era dos blockbusters (produção com efeitos especiais para arrastar multidões) e dos produtos agregados (venda de bonecos, revistas, games e roupas).
Trilogia prelúdio
Inclui os filmes A Ameaça Fantasma (1999), O Ataque dos Clones (2002) e A Vingança dos Sith. A Ameaça Fantasma foi um gigantesco evento midiático e um dos filmes mais esperados da história. Contudo, essa produção e as duas sequências decepcionaram fãs e críticos por terem uma narrativa com furos no roteiro, interpretações ruins dos atores e efeitos artificiais demais. A trama se passa antes dos eventos da trilogia original. Os fãs mais radicais inclusive se viraram contra George Lucas.
Nova trilogia
É a retomada de Star Wars sob o controle da Disney, que adquiriu os direitos da saga de George Lucas em 2012. Em 2015, foi lançado O Despertar da Força, que conta a história após os eventos da trilogia original. Com os novos filmes, a Disney anunciou a produção de produções paralelas, os chamados spin-off. O primeiro deles, Rogue One, foi lançado em 2016 e o próximo é Solo, programado para 2018.