20/10/2019 O Sul Online Geral Pg. 25 Bispos brasileiros defendem ordenação de homens casados como padres No fim da primeira etapa de discussões do Sínodo para a Amazônia, 12 grupos de trabalho, nos quais foram divididos 177 bispos, divulgaram suas conclusões sobre os temas mais polêmicos do encontro. A maioria deles manifestou apoio à ordenação de homens casados (“viri probati”) e de mulheres. Também houve reivindicações, especialmente entre os religiosos brasileiros, a mais diálogo com as igrejas evangélicas e à criação de um observatório de direitos humanos para a proteção de indígenas. Embora os bispos sejam unânimes em pregar o diálogo com as culturas amazônicas, além da defesa da população nativa contra situações de violência, alguns religiosos ressaltaram que a Igreja não pode servir ”como uma ONG”. Por isso, recomendam que o Vaticano, além de reivindicar a justiça social na floresta, sublinhe seu discurso sobre espiritualidade. Os religiosos foram divididos em grupos de acordo com o idioma com que exercem seu trabalho. Assim, havia dois ”ciclos menores” em italiano, quatro em português, cinco em espanhol e um dividido entre inglês e francês. Todos dos ciclos de idioma português – que são os religiosos brasileiros – e espanhol defenderam a ordenação de homens casados para a região, considerando que estes sacerdotes garantiriam a aproximação entre a Igreja e as populações indígenas. Outros bispos, porém, foram reticentes. Para os italianos, a ordenação de homens casados poderia reduzir o valor do celibato e deveria ser discutida em um sínodo de alcance global, e não em uma reunião voltada apenas para a Amazônia. 'Questão Delicada' Professor do Departamento de Teologia da PUCRS, Geraldo Luiz Borges Hackmann pondera que a ordenação de homens casados já é discutida em sínodos desde 1969, mas o Sínodo para a Amazônia é o primeiro a incluir o “viri probati” em sua pauta formal. ”É uma questão delicada, envolve um tema de longa tradição da igreja ocidental: a relação espiritual entre celibato e sacerdócio”, explica. ”O sínodo pode propor o “viri probati”, mas não tem poder para decretá-lo.” Os religiosos brasileiros também foram os mais enfáticos ao exigir políticas públicas destinadas aos indígenas – entre elas, a demarcação de territórios e o incentivo à criação de um observatório de direitos humanos. Houve acusações de ”omissão do Estado” diante da ”violência institucionalizada” na Amazônia. Entre os principais problemas, segundo os bispos, estão o feminicídio, o tráfico de pessoas e os massacres em presídios superlotados: ”A Igreja propõe incentivar as denúncias dando suporte às mulheres”. 'Igreja não pode virar uma ONG' A ressalva, desta vez, veio do ciclo composto por bispos de idioma inglês/ francês: ”Devemos ter cuidado de não fazer da Igreja uma ONG em serviço exclusivo da justiça social. Algumas pessoas confiam em nós no que se refere a justiça, educação, saúde e, no entanto, vão às igrejas pentecostais para celebrar, escutar a Palavra de Deus”. Hackmann defende o envolvimento da Igreja com temas sociais, mas descarta a hipótese, aventada pelo governo Jair Bolsonaro, de que as sugestões discutidas pelos bispos atentam contra a soberania nacional. ”A busca de temas sociais faz parte da missão espiritual da Igreja. Falar sobre salvação de Deus não deve ser uma evangelização abstrata”, avalia. ”No Brasil, a preocupação com esta temática é antiga, não foi iniciada como uma reação ao governo Bolsonaro. O Sínodo não ataca a soberania nacional. Ninguém está propondo a criação de um governo panamazônico.” Aquecimento Global Os bispos também assinalaram a importância da floresta no combate ao aquecimento global, já que as árvores retêm a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera. A encíclica papal “Laudato Si”, dedicada ao meio ambiente, é citada, ao todo, sete vezes pelos grupos de trabalho. O engajamento do Papa Francisco ao tema irrita a ala conservadora da Igreja, que acredita que o Vaticano não deve se pronunciar sobre temas científicos. Os textos compostos pelos grupos de trabalho são contribuições, sem valor oficial, entregues à Secretaria Geral do Sínodo. Seus integrantes coletarão as principais propostas e vão apresentá-las em um relatório, que é submetido a votação entre todos os bispos. O documento final, considerando os resultados da assembleia plenária, é apresentado por outro grupo, coordenado pelo relator do Sínodo, Dom Claudio Hummes, ao Papa Francisco. Após ler o relatório dos bispos, o Pontífice faz seu próprio documento, a exortação católica pós-sinodal. No texto, diz que medidas pode tomar a partir do resultado do encontro episcopal. Entre os destinos possíveis estão a formação de grupos de trabalho para aprofundar debates sobre determinados tópicos, pôr as propostas dos bispos em vigor ou simplesmente ignorá-las. O Sínodo para a Amazônia será encerrado no dia 27. No dia seguinte, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, apresentará no Vaticano os planos do governo para o desenvolvimento sustentável na Amazônia e as estratégias nacionais para a Conferência do Clima (COP25), que ocorrerá em dezembro, em Santiago.