06/01/2018
Pioneiro
Geral | Pág. 10
Clipado em 06/01/2018 05:01:28
Caxias, 2017: foi como você previa?
Pioneiro revê reportagem publicada há 10 anos e mostra o que mudou de lá para cá

Há 10 anos, quando Caxias do Sul tinha 415 mil habitantes, o celular mais popular entre os brasileiros sequer tinha câmera fotográfica e o primeiro modelo do iPhone era apresentado aos americanos, o Pioneiro publicou uma reportagem que tentava prever como seria viver em Caxias em 2017.

Entre previsões tecnológicas e outras que tentavam traçar como seria o futuro da cidade na próxima década, há acertos inegáveis. Principalmente no que diz respeito à vida digital, com celulares que permitem rastrear pessoas, enviar arquivos para nuvens virtuais e interação quase que imediata com qualquer pessoa, em qualquer lugar.

No entanto, é possível confirmar que a população tem expectativas que se arrastam há mais de uma década, como o tão sonhado trem regional ou aeroporto de cargas. Nem mesmo a previsão populacional se confirma: o crescimento do número de habitantes ficou bem abaixo do esperado – claro sinal de um comportamento de migração de pessoas jovens, que chegam em Caxias cedo, para trabalhar, mas costumam voltar à cidade de origem quando envelhecem, conforme interpreta o professor da UCS João Ignácio Pires Lucas, doutor em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

– A cidade tem um fluxo migratório importante e, principalmente, de gente jovem. Caxias do Sul fica distante das cidades da região porque não tem o mesmo ritmo de envelhecimento populacional e, por isso, acabou crescendo menos que o esperado – explica o professor.

Há muitas pessoas que se mudam para Caxias do Sul, mas há caxienses que gostam de deixar a cidade para buscar oportunidades diferentes, principalmente quando o assunto é educação. E a principal personagem da reportagem de junho de 2007 do Pioneiro é um exemplo clássico deste comportamento. Aos 20 anos, Danielle Rodrigues Guidini não conseguiu cumprir uma das promessas que fez à reportagem em 2007, quando completou 10 anos.

Ao sentenciar que muita coisa seria diferente, mas queria continuar vivendo em Caxias, a jovem não imaginava que escolheria Porto Alegre como lar definitivo. Danielle, que segue tendo excelentes notas e com amor declarado aos estudos, passou em sete vestibulares para cursar Estatística. Matriculada há três anos na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Danielle trabalha com tecnologia da informação e marketing digital, profissão que sequer existia há 10 anos. Há uma década, ela declarava ao Pioneiro que sonhava ser médica ou arqueóloga.

– Eu fui percebendo no Ensino Médio que muita coisa pendia para o lado das exatas, então foi minha escolha natural. Mas não imaginava que hoje produziríamos tantos dados virtuais, que seriam passíveis de análise e interpretação em banco de dados – reconhece.

Nesses 10 anos, Danielle é uma das caxienses que vivenciou a crise econômica nacional. Por conta dessa situação, Caxias do Sul não atingiu a projeção financeira que o município fazia, de crescimento acumulado de 50% na economia. A Câmara da Indústria e Comércio (CIC) estima que este crescimento tenha sido de até 40%, mas não avalia este dado como negativo diante do contexto nacional e estadual.

Danielle concorda, e diz que fica impressionada com a quantidade de empreendimentos e novidades que acontecem na cidade. Daqui uma década, ela pretende estar morando fora do país e com família constituída. Porém, ela já percebeu que nem sempre as previsões são certeiras.

– Vamos ver sempre o dia de amanhã, não é? Hoje, estou feliz em Porto Alegre, mas sinto falta da minha família. Não descarto voltar a morar em Caxias, mas hoje não penso nisso. Quero fazer mestrado, doutorado, quem sabe morar na região do Vale do Silício – projeta.

A VIDA REAL

População

- Previsão: estimava-se que a população seria de 520 mil habitantes. Em 2007, eram 415 mil moradores. O crescimento esperado era de 2,38% por ano. Calculava-se ainda que a tendência seguiria sendo mais mulheres que homens. Além disso, previa-se um crescimento da população urbana, que correspondia a 95,5% do total, e diminuição da porcentagem dos que viviam na zona rural.

- Realidade: o crescimento não se confirmou. Estimativa do IBGE é de que 435.564 pessoas residam em Caxias atualmente. O crescimento anual girou, em média, de 0,86%, bastante abaixo do previsto.Com relação ao sexo, dados do IBGE confirmam a previsão, mas com diferença baixa: a estimativa é que 50,95% dos moradores sejam mulheres, e 49,05% homens. Outro dado que se concretizou foi o crescimento da população urbana, hoje estimada em 96,29% do total.

Economia

- Previsão: em 2017, a economia cresceria 50%, segundo estimativa a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC). Haveria ainda um crescimento da participação do Produto Interno Bruto (PIB) de Caxias no Estado. Em 2007, era de 5,68%.

- Realidade: segundo o presidente da CIC, Ivanir Gasparin, o crescimento da economia oscilou entre 35% e 40%. Conforme a Fundação de Economia e Estatística (FEE), o PIB de Caxias do Sul representa 5,4% na realidade estadual, ou seja, diminuiu em relação a 2007.

Ensino

- Realidade: não houve apliação significativa de estrutura nesses 10 anos, mas a UCS pretende, em breve, construir um laboratório para análise de compatibilidade para doação de órgãos, serviço hoje só realizado em Porto Alegre, uma escola para formação de lídereres e ampliar espaços de inovação e empreendedorismo. Também houve a criação do TecnoUCS, parque de ciência e tecnologia. A média de alunos é de 27 mil inscritos. Mas o Ensino Superior recebeu acréscimo importante de qualidade. A FSG, que era faculdade e se transformou em Centro Universitário da Serra Gaúcha, tem mais de 100 opções de cursos de graduação, pós-graduação e extensão, e atua também na área de pesquisa. Quem também cresceu foi a Faculdade de Tecnologia (Ftec), que virou centro universitário e oferta mais de 40 cursos de graduação, oito cursos de pós-graduação, 13 cursos técnicos e outras opções de ensino.

- Previsão: a UCS não pretendia ampliar estrutura de prédios para aulas até 2017. A média de alunos seguiria sendo 30 mil.

Segurança

- Previsão: estimava-se que a violência tomaria proporções ainda maiores, representada pelo crescimento no índice de homicídios. Em 2006, foram 120 mortos violentamente. Projetava-se ao menos 200 vítimas de homicídio para 2017.

- Realidade: ainda que a violência seja vivenciada dia após dia pelos moradores em diversas situações, o número de homicídios de 2017 chegou a 126 vítimas.

Poder Público

- Previsão: a prefeitura passaria a atuar de forma descentralizada, espalhando-se em núcleos por, pelo menos, 14 bairros. O bairro Ana Rech receberia o projeto piloto.

- Realidade: com exceção das subprefeituras que atuam na zona rural, o poder público segue trabalhando de forma centralizada.

Transporte

- Previsão: em 2017, estimava-se que um anel viário de 45 quilômetros contornaria a cidade, passando por bairros e distritos. Também falava-se que já estaria em operação o transporte ferroviário, reativado para fins turísticos. O sistema de transporte aéreo também era considerado, já que o novo aeroporto de Vila Oliva era projetado para 2017, facilitando a logística das empresas da Serra.

- Realidade: entrou em operação em abril de 2016 o Sistema Integrado de Mobilidade (SIM Caxias), que passou a priorizar a circulação de ônibus na área central e implantou duas estações de transbordo. O anel viário também não saiu do papel, e a população segue aguardando a duplicação de trechos da BR-116 que cortam a área urbana da cidade. Além disso, nem o trem regional nem o aeroporto de Vila Oliva têm previsão de serem construídos, já que ficaram presos a questões políticas ou à falta de dinheiro.

Habitação

- Previsão: 15 bairros da cidade, formados a partir de invasões de décadas atrás e que recebem investimentos públicos de infraestrutura, estariam regularizados em uma década.

- Realidade: em 2017, a prefeitura não executou obras em 260 loteamentos irregulares sob a justificativa de estar cumprindo a lei e com o receio de enfrentar processos semelhantes ao da família Magnabosco.

A VIDA DIGITAL
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Celular faz-tudo

- Realidade: alguns aspectos são realidade, outros não se consolidaram como tecnologia popular e talvez nunca se consolidem. O celular enquanto relógio existe, mas funciona como um acessório, e não o dispositivo principal. Teclado do celular, enquanto meio físico, sumiu. No entanto, está disponível na tela, ativado quando o contexto necessita, seja para digitação de números ou textos. Fones de ouvido e microfones embutidos no ouvido, como pontos na atividade musical e jornalística, ainda não estão disponíveis massivamente, e acredito que não vingarão. O sistema de localização, sim. Esse está cada vez mais presente, e é uma realidade ainda em evolução.

- Previsão: o celular seria um relógio ou acessório preso ao corpo. O teclado sumiria, o dono daria comandos com a fala e, com um sistema de localização preciso, seria possível usar o celular para encontrar pessoas ou receber informações.

TV e vídeo

- Realidade: gravação de programação não é uma realidade pela forma como a tecnologia evoluiu. Ainda que essa tecnologia exista, não há necessidade da programação ser gravada, já que tudo está disponível na nuvem – com o surgimento de provedores de streaming, disponíveis não apenas nas TVs, mas em qualquer dispositivo conectado à internet.

- Previsão: embutidos em TVs, recursos gravariam a programação de até 40 canais simultaneamente e os transmitiriam a outros dispositivos. TVs com acesso à internet, e totalmente interativas, permitindo pausas, gravações e modificação dos conteúdos em tempo real.

Internet

- Realidade: a tecnologia para produção de telas flexíveis existe. No entanto, ainda não está disponível para aquisição de forma massiva, e talvez não se torne uma realidade. Os sistemas de conexão com a internet têm evoluído, mas ainda estão localizados nas casas e nas empresas. Sistemas públicos e, principalmente, gratuitos, não são uma realidade, e muito provavelmente não serão, pois é um filão a ser explorado pelas empresas que disponibilizam tanto internet, quanto telefonia e TV digital.

- Previsão: tecnologia de cristal líquido combinado a silício permitiria a fabricação de telas flexíveis e dobráveis de baixo custo. Não seria necessário ter conexão fixa ou ponto de Wi-Fi. Como a internet não teria limites, será possível assinar um canal de TV do Japão com facilidade.

Computador

- Realidade: a tendência é que desapareça o computador de mesa para uso pessoal, e que o BYOD (Bring Your Own Device) se torne realidade. Na prática, a tendência é que cada profissional carregue seu próprio dispositivo de trabalho, como notebook ou tablet. Mas isso, por enquanto, não é realidade.

- Previsão: computadores de mesa se tornariam obsoletos. Os novos aparelhos seriam portáteis e pesariam menos de 500 gramas. Construída em fibra de carbono, a máquina resistirá à água, quedas e impactos.

Games

- Previsão: a realidade sintetizada, como seria chamada, viria com selos de alerta, pois não será possível dizer o que é realidade ou imaginário a olho nu. Sintetizadores alimentados por pequenos cartuchos adicionariam até cheiros aos jogos.

- Realidade: o mercado de games se tornou gigantesco e global. Eventos vinculados a jogos têm atraído mais público que eventos clássicos no mundo esportivo, mas a disponibilidade de cheiro e textura aos jogos não vingou.

MP3 inteligente

- Previsão: a aposta era que o MP3 mediria o biorritmo do usuário e sugeriria assim as músicas mais adequadas. Se houvesse alguém próximo a você com gosto parecido, o MP3 avisaria, perguntando se você deseja interagir com aquela pessoa.

- Realidade: não se confirmou. O que despontou foi a disponibilização de serviços de streaming de áudio, como os oferecidos pela Spotify.

Foto

- Previsão: máquinas digitais com software deixariam as pessoas mais bonitas. O problema do armazenamento acabaria: assim que feitas, as fotos seriam enviadas para um arquivo online. A câmera avisaria, por som, quando a imagem estivesse mal-enquadrada e daria sugestões.

- Realidade: foram implantados sistemas de correção de imperfeições nas fotos, ajustes automáticos de cores, contraste e luminosidade. As câmeras e celulares permitem envio de fotos para a nuvem, ainda que de forma relativamente lenta, e sistemas de reconhecimento facial, identificam o rosto e também quando a pessoa está sorrindo.