21/03/2018
Jornal NH
Especial | Pág. 8
Clipado em 21/03/2018 04:03:42
Elas ainda ganham menos do que eles

Quantia que equivale a quase metade de um salário mínimo é também a diferença entre o que foi pago no ano passado para empregados homens e mulheres no Vale do Sinos. Enquanto eles receberam um rendimento médio real mensal de R$ 1.931,00, a elas foram pagos apenas R$ 1.526,00, uma diferença de 405 reais. Valor que, obviamente, faz falta no bolso feminino. Para complicar ainda mais a situação, o levantamento inédito divulgado ontem pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) detalhou outras disparidades entre os gêneros no mercado de trabalho.

Além de receberem pagamentos menores, as mulheres lideram os números de desemprego e possuem a menor taxa de ocupação na economia. E isso que, quando se fala de capacitação, são elas as maiores detentoras de diplomas na região. Apesar de não listar novidades, visto que a desigualdade é histórica, os dados da pesquisa A Inserção da Mulher no Mercado de Trabalho da Região do Vale do Rio do Sinos especificam a difícil situação vivida pelas trabalhadoras. "Se trata de preconceito, de machismo, que faz com que se diminua a oferta de vagas e se reduza o salário das mulheres. Ainda acontece de não contratá-las por conta da maternidade, de licenças ou de eventuais saídas para atender os filhos. É uma carga muito pesada que recai sobre a mulher", afirma a economista com mestrado em Desenvolvimento Econômico e professora da Universidade Feevale, Kátia Isse.

PERFIL DELAS NA REGIÃO

O tempo médio de permanência das mulheres no posto de trabalho foi quatro meses inferior ao dos homens.

De maneira geral, predominam no Vale do Sinos trabalhadores com idades entre 25 e 49 anos, sendo eles os chefes ou principais responsáveis pela manutenção de suas famílias e com ensino médio completo.

Quanto ao gênero, as mulheres ocupadas são mais jovens que os homens. Enquanto 79% delas têm até 49 anos, 75,6% deles ficavam nessa faixa etária. E 5,8% da população masculina ocupada já haviam ultrapassado 60 anos. A maioria das mulheres ocupadas na região têm grande responsabilidade ou corresponsabilidade com suas famílias. Enquanto 48,8% delas dividiam atribuições de manutenção com companheiros ou companheiras, na condição de cônjuges, um terço das ocupadas (32,7%) eram reconhecidas como principais responsáveis ou chefes de suas famílias.

Dentre os ocupados do Vale do Sinos, as mulheres apresentam escolaridade superior aos homens, sobretudo pelo alcance do diploma universitário, que para elas é de 13% e para eles, 7,3%.

183 MIL TRABALHADORAS X 230 MIL TRABALHADORES

Embora sejam a maioria da população, as mulheres são minoria quando se trata das pessoas economicamente ativas. No ano passado, o Vale do Sinos contava com 183 mil trabalhadoras. O número representa 46,2% do total de mulheres com dez anos ou mais residentes em Araricá, Campo Bom, Dois Irmãos, Estância Velha, Ivoti, Nova Hartz, Novo Hamburgo, Parobé, Portão, São Leopoldo e Sapiranga. Os homens, por outro lado, estavam em 230 mil postas de trabalho, com um percentual de ocupação bem superior, de 61,9%.

DESEMPREGO É MAIOR PARA ELAS

A incidência de mulheres no mercado de trabalho é dificultada também pelo desemprego, que as atinge com maior severidade. No Vale do Sinos, em 2017, 9,7% do total das trabalhadoras tiraram sem emprego, o equivalente a 18 mil mulheres. Já os homens foram 7,2%, ou 16 mil sem trabalho. No total geral, as mulheres são 60,1% dos inativos e 51,9% dos desempregados na região. A dificuldade em encontrar emprego é maior entre as jovens, com idades entre 16 e 24 anos, e as adultas na faixa etária dos 25 aos 39 anos. Outro dado que apresenta divergência ente homens e mulheres com relação ao desemprego é o tempo médio para se conseguir uma recolocação. Enquanto eles levaram 35 semanas na busca por trabalho, elas precisaram de 41 semanas para conseguir um cargo.

BAIXA ATUAÇÃO EM INDÚSTRIA E CONSTRUÇÃO

Apesar de o Vale do Sinos ter maior demanda de empregos na área industrial, as mulheres não conseguem grande número de colocações neste setor. O mesmo acontece na construção civil, que também é liderada pelos homens. Assim, as mulheres são absorvidas majoritariamente no segmento de serviços e os homens se ocupam relativamente mais na produção fabril. Na região, 75,7% das mulheres são assalariadas. Destas, 65,9% atuam no setor privado, 9,8% no setor público, 8,2% são autônomas e 7,4% são domésticas. O restante atua em áreas diversas. Já entre os homens, 74,8% são assalariados, sendo que 70,3% atuam no setor privado, 4,4% no setor público, 12,5% são autônomos, e não há amostra de homens que atuem como empregadas domésticos.

COMO MUDAR ESTE CENÁRIO

Tendo sentido na pele a desigualdade com que são tratadas as mulheres no mercado de trabalho, a economista Kátia Isse orienta que as trabalhadoras sigam em busca de capacitação. No caso dela, que chegou a ser a única mulher em um setor onde só havia homens, ao passar para a etapa final de uma seleção, descobriu que não foi contratada somente pelo fato de ser mulher. "A seleção ficou entre um rapaz e eu e, na época, a empresa escolheu ele porque não tinha família, não iria engravidar, teria maior disponibilidade, na visão deles. Ali eu senti realmente essa diferenciação de gênero no mercado de trabalho", comenta.

Para reverter este cenário, a economista orienta que a busca por capacitação seja constante e que as trabalhadoras consigam provar que ser mulher não é um problema "Até porque elas conseguem fazer diversas coisas ao mesmo tempo. Tem que quebrar esse tabu de sexo frágil. O trabalho feito pela mulher é igual e até mesmo superior ao do homem, em qualquer área. Só vamos conseguir equalizar isso se as mulheres continuarem se fortalecendo, procurando se destacar e mantendo sua qualificação", recomenda.

QUESTÃO CULTURAL

Coordenadora da pesquisa e responsável por apresentar os dados, a economista Lucia Santos Garcia defende uma mudança cultural para que as oportunidades entre homens e mulheres se equiparem."As mulheres recebem menos também porque as mulheres adentram menos esse mundo produtivo. E isso acontece porque elas têm muitas responsabilidades tora do mundo produtivo, com a casa, com os filhos, com os pais velhos", enumera." Há toda uma organização pessoal, de cuidados com os outros e de afazeres domésticos.As mulheres despendem o dobro de tempo que os homens nesse tipo de atividade", argumenta. A economista também aponta que, em geral, as mulheres estão em profissões que não são valorizadas pelo mercado de trabalho. "Um exemplo é a educação.As mulheres estão na educação infantil, na educação básica e não estão majoritariamente nas universidades", exemplifica.

Os números

Conforme o Sebrae, as mulheres ocupam 43,2% dos cargos de gerência nas micro e pequenas empresas.

Conforme dados da FEE, na região, as mulheres são maioria em 24 cidades. Somente em Nova Hartz, a população é composta por 50% HOMENS e 50% MULHERES.